O explorador islandês Leif Erikson segundo os
dados históricos mais precisos viveu de 970 a 1020. Não é exatamente alguém lembrado pela maioria
das aulas de história como Cristóvão Colombo, mas Leif esteve na América quase
500 anos antes de Colombo. Suas viagens
são contadas, com certo grau de imprecisão, na Saga de Erik o Vermelho e na Saga
dos Groenlandeses. Os motivos para
as Américas falarem em sua grande maioria espanhol, inglês e português ao invés
de uma língua nórdica são vários e merecem uma certa reflexão.
No ano 1000, em plena Idade Média, as
principais nações européias estavam fragmentadas e sofriam para repelir os
vários invasores bárbaros. Espanha e
Portugal travavam lutas por sua independências dos invasores árabes que
dominaram por quase 500 anos a Península Ibérica. A França apesar de Carlos Magno se fragmentou
em vários feudos por volta desta época.
A Inglaterra também feudal lutava contra as constantes invasões vikings,
sendo que estes naquela época chegaram a estabelecer domínio sob parte de território
inglês que incluía a cidade de York.
Os vikings eram grandes exploradores, segundo
relatos estiveram além da Grã-Bretanha no norte da África, Sicília, Rússia, Ucrânia
e até em Bagdá. Mas foram imortalizados
na memória popular pelo terror que os saques em território inglês impunham na
população local. Apesar das pilhagens,
os vikings tinham uma extensa rede de comércio pela Europa e oeste da Ásia,
avançados conhecimento de navegação e tecnologia naval. Os povos nórdicos estabeleceram colônias em
ilhas do Atlântico Norte como as Faroe e principalmente na Islândia. Mas não pararam por aí e estabeleceram uma
colônia na Groenlândia, inicialmente mal-sucedida. Tecnicamente a maior ilha do mundo já é no
continente americano, então a data da primeira colônia americana é, de acordo
com relatos das sagas, 985 quando Erik o Vermelho chegou à ilha americana com
14 navios. A primeira colonização da
Groenlândia durou pouco mais de 500 anos, por motivos ainda não esclarecidos a
população nórdica naquela ilha simplesmente sumiu.
O mais impressionante é que o filho de Erik o
Vermelho, Leif Erikson, foi além de seu pai.
Após ouvir relatos de um outro navegador, Bjarni Herjólfsson, de ter avistado
terras ao oeste da Groenlândia, Leif montou sua expedição para descobrir estas
terras. Chamou seu pai, mas este pelos
relatos caiu de um cavalo e não embarcou na expedição por ter machucado o
pé. Mesmo assim Leif reuniu cerca de 35 corajosos
para ir além da Groenlândia. Leif e seus
bravos seguidores chegaram na América, no atual leste canadense, em três locais
sendo que o último deles foi batizado de Vinlândia, que alguns acreditam ser na
ilha canadense de Terra Nova.
Atualmente, acredita-se que a Vinlândia seria no Golfo do Rio São
Lourenço, no Labrador. Os relatos das
duas sagas são um tanto questionáveis, mas acredita-se que a viagem de Leif
tenha sido em torno de 1001. Leif e seus
irmão exploraram a Vinlândia por quase uma década, tentaram criar um pequeno
estabelecimento em solo americano, mas notadamente não foram bem
sucedidos. Um de seus irmãos, Thorvald,
foi morto em um confronto com nativos americanos em 1004 e outro, Thorstein,
morreu antes de zarpar da Groenlândia para a Vinlândia. Apesar de relatarem uma terra rica em salmão,
uvas e madeira, o fato é que a colonização nórdica fracassou. Hoje o que resta na são as ruínas de L’Anse aux Meadows na Terra Nova, uma
aldeia que talvez tenha sido construída para reparos nos navios dos
exploradores nórdicos.
Algumas hipóteses podem ser tecidas para
explicar este fracasso, vários historiadores atribuem às hostilidades entre os
nativos e os exploradores o fato destes últimos desistirem de se aventurar mais
no continente americano. Acredito que os
povos nórdicos naquela época não tinham recursos para se aventurarem tão distante. Os vikings tinham seus negócios focados na
Europa e na Ásia, e um empreendimento tão distante era nada atrativo. A população nórdica pelas estimativas
históricas não deve nem ter chegado perto de 1 milhão de habitantes. Simplesmente não havia nórdico suficiente
para se colonizar muito além da Islândia.
O custo de se trazer produtos da Terra Nova seria proibitivo em
comparação com os custos de produtos semelhantes oriundos da Europa e da Ásia,
o que traria inevitáveis prejuízos. E, é
claro, Erik o Vermelho e sesu filhos apesar de todo o empreendedorismo não tinham
capacidade e nem o conhecimento de criar uma indústria local, estabelecer um
diálogo com os nativos americanos, divulgar sua descoberta, comercializar os
produtos americanos em outros locais, em suma faltou marketing para eles serem
bem sucedidos.
O fracasso da primeira colonização na
Groenlândia mostra que havia uma limitação para a expansão colonial
nórdica. Quando Colombo chegou à América, quase 500
anos depois de Leif, a Espanha tinha um contingente maior de recursos para
investir naquela empreitadas, sem contar a motivação de buscar novas rotas de
comércio após a queda do Império Bizantino e a dificuldade em se restabelecer
as rotas pelo Oriente Médio. Inglaterra
e Portugal também foram bem sucedidos na colonização do continente americano,
enquanto França e Holanda tiveram resultados pífios em comparação com estas
três nações. A Rússia também chegou ao
continente americano bem depois mas desistiu oficialmente da empreitada
vendendo o Alaska para os americanos.
Este aliás um negócio à primeira vista ruim para os russos dado a
quantidade de ouro e petróleo naquelas terras, mas justificável sob a ótica que
era difícil o acesso de Moscou ao Alaska uma vez que a rota de suprimentos
teria de atravessar o vasto e pouco desenvolvido norte do continente asiático.
A primeira descoberta da América nos deixa a
lição que nem sempre os pioneiros de um avanço tecnológico ou de uma descoberta
científica serão aqueles que colherão os louros do sucesso. No Brasil, podemos lembrar que fomos pioneiros
no uso de etanol como combustível de automóveis, mas isso não garantiu que nos mantivéssemos
na vanguarda da tecnologia sucroalcooleira.
Apesar das condições ótimas para o cultivo da cana de açúcar, passamos
pelo vexame de importar etanol. Pode-se
dizer que o Brasil dormiu no ponto. Não
é um fracasso retumbante como a colonização nórdica na América, mas algumas
questões são levantadas para justificar termos sido ultrapassados. Faltou ao Brasil uma busca maior por
aprimoramento tecnológico, recursos humanos necessários para se pesquisar mais
sobre este processo, tanto no aspecto tecnológico como mercadológico, e também
uma visão empresarial mais arrojada e menos acomodada. Não custa lembrar que este último fator
resultou na década de 1990 na reversão da frota que era quase de 90% de carros
a etanol para quase 90% de carros a gasolina, após os usineiros deixarem todos
os consumidores sem etanol nos postos para produzir açúcar. É claro que as condições macroeconômicas
atuais não favorecem tanto o etanol, mas certamente o Brasil deveria estar em
melhor colocado.
Vários exemplos podem ser comparados com este
fracasso histórico. Nações, empresas,
indivíduos muitas vezes serão pioneiros em algum momento, mas sem os recursos
necessários rapidamente perderão a dianteira.
Os cientistas brasileiros que conseguirem nestas terras ter a capacidade
de triunfar diante de tantas adversidades muito provavelmente serão convidados
para continuarem suas pesquisas em outros países com melhores condições, algo
que já é bem comum diga-se de passagem e não exclusivo ao Brasil. Faltam recursos de todos os tipos para o
Brasil desenvolver inúmeros tipos de tecnologias pioneiras. Empresas pequenas que desenvolvem novos
produtos são muitas vezes compradas por empresas bem maiores que possuem
recursos financeiros muito mais abastados.
Basta ver o que aconteceu com o Waze e o WhatsApp recentemente
adquiridos por Google e Facebook. Na
contramão, pode se lembrar da Netscape que resolveu enfrentar a Microsoft e se
deu mal.
Acredito que se Leif Erikson tivesse nascido
500 anos depois, teria sido contratado ou pelos ingleses ou pelos espanhóis
para tocar expedições para a América.