quinta-feira, 19 de março de 2015

Quando a Burguesia se Rebela



“A burguesia fede / A burguesia quer ficar rica / Enquanto houver burguesia / Não vai haver poesia”.  Para aqueles que têm mais de 30 anos, a música Burguesia de Cazuza será familiar.  É provavelmente uma das canções mais estúpidas já compostas no país, uma diatribe, composta por um artista super-valorizado.  A música ataca a direita, um ataque feito por alguém que se confessava burguês mas de esquerda, apesar de nunca ter vivido em qualquer país socialista.  Se tivesse um mínimo conhecimento de história e coerência, saberia que a burguesia teve grande importância no estabelecimento de princípios republicanos e democráticos.

Com o fim da Guerra dos 7 Anos em 1763, a França perdeu para a Grã-Bretanha a maioria de suas colônias na América do Norte, mas ambos franceses e britânicos sobraram com dívidas volumosas para pagar.  Como nos dias de hoje, quando uma nação se endivida, quem paga a conta é a população.  No caso da Grã-Bretanha, a conta foi passada para as colônias americanas que, obviamente, não gostaram nenhum pouco e alegaram que as colônias pagaram um preço alto com a vida de vários colonos na guerra.  A coroa britânica subestimou gravemente a capacidade de organização dos colonos, bem como o alto de grau de insatisfação entre eles.  Os treze anos que sucederam ao fim da guerra marcou uma escalada de conflitos entre a coroa e as colônias, em específico a de Massachussetts, em que cada medida imposta para ampliar a arrecadação na América era respondida com crescente insurgência.  As colônias britânicas na América eram prósperas, mas não tinham representação no parlamento britânico, o que enfurecia uma grande parte dos americanos.  Apesar de apenas cerca de 45% dos colonos, os Patriotas, apoiarem a independência, esta foi declarada em 4 de Julho de 1776.  Muitos dos Patriotas eram profissionais liberais, fazendeiros e comerciantes que exigiam sufrágio universal, entre os homens brancos pelo menos.

O início da Guerra da Independência Americana foi duro para os Patriotas, uma vez que enfrentavam uma das maiores potências militares, senão a maior, na época.  Mas o exército de George Washington combatia em seu solo e obteve importantes vitórias contra os britânicos como na Batalha de Saratoga em 1777.  Esta foi o convite para os ressentidos franceses se aliarem aos Patriotas contra seus tradicionais rivais.  Se este não foi o ponto de inflexão no conflito, com certeza sacramentou a investida americana para conseguirem expulsar os britânicos em 1783.  Os franceses tinham como objetivo retomar parte de seus territórios perdidos em 1763, mas só conseguiram ao final do conflito tomar Tobago no Caribe e Senegal na África.  No final, o único objetivo prático foi a pirraça.  Muito pouco para um país altamente endividado pelo conflito anterior e que ainda por cima perdeu boa parte de sua frota naval no conflito americano.  O resultado foi que a França ficou ainda mais endividada.

A França era um país de contrastes, pois enquanto tinha uma população basicamente rural e até locais onde o feudalismo persistia, possuía uma classe média bem estabelecida em suas principais cidades, principalmente Paris, que era conhecida como a burguesia.  Mas o poder era dividido entre o clero e a nobreza, respectivamente o primeiro e o segundo estado.  Estes possuíam a maior parte das terras no país e eram basicamente isentos de impostos.  Quem arcava com os impostos era a burguesia, o terceiro estado, e quem levava o pior era a população mais pobre, que nos anos seguintes amargou até fome devido a safras ruins que encareciam os alimentos, inclusive o pão.  Apesar da escalada da crise, o clero e a nobreza da França não se mostraram realmente dispostos a mudar de postura e continuaram sua política de apertar cada vez mais a população.  O aparelhamento das instituições públicas era extenso e uma maneira de nobres e parentes dos nobres ganharem dinheiro de impostos sem ter que trabalhar.

O resultado foi conhecido, no dia 14 de julho de 1789, após a demissão do ministro das finanças Jacques Necker, que era bem visto pela burguesia, os conflitos finalmente escalaram ao ponto que o rei Luís XVI perdeu o controle da nação.  Uma turba invadiu a Bastilha, a infame prisão parisiense, e apesar de ter basicamente só liberado alguns loucos e falsificadores a invasão é o marco do início da Revolução Francesa.  Os anos seguintes à queda da Bastilha foram marcados por extrema instabilidade política, a burguesia apesar de estar unida contra o clero e a nobreza, não era exatamente unida entre si.  Veio o Reino do Terror com os Jacobinos em 1793 e dezenas de milhares de franceses foram para guilhotina, inclusive a rainha Maria Antonieta, aquela a quem atribuíram a infame frase “Que comam bolo” quando supostamente a informaram que o povo não tinha pão para comer.  A situação demorou para se tornar estável na França.  Napoleão Bonaparte ascendeu ao poder com um golpe em 1799 e só foi destituído com a famosa derrota em Waterloo para uma aliança de nações lideradas pelo Reino Unido.  A democracia demorou muito mais para se consolidar naquele país.

Apesar disso, a Revolução Francesa trouxe importantes reformas sociais, políticas e econômicas à França.  Foram abolidos os privilégios hereditários da nobreza e do clero, e estes dois perderam suas terras e poderes, o feudalismo foi abolido, e um sistema de meritocracia foi implementado inclusive nas Forças Armadas francesas.  A Revolução Francesa para vários historiadores é considerada como o marco do início da Idade Contemporânea e o fim da Idade Moderna.

A burguesia em 1789, e também em parte em 1776, se rebelou contra governos autoritários e parasitas.  Governos que oprimiam a classe trabalhadora e geradora de riquezas para benefício próprio.  Estas insurgências resultaram em ganhos de direitos civis não só para a própria burguesia como para toda a população.  É claro que outros direitos só foram obtidos posteriormente, como o fim da escravidão em 1861 nos EUA.

Com a proliferação do populismo no Século XX e XXI, principalmente o de esquerda, as castas governantes aprenderam a defletir a responsabilidade das mazelas da população em geral para a burguesia, que ganhou a pecha de vilã não só perante a população mais humilde como diante de uma parcela da própria burguesia.  Como o intitulado “poeta do rock” já cantava “Eu sou burguês, mas eu sou artista / Estou do lado do povo, do povo”.  A burguesia deveria ter orgulho de seu passado glorioso.

Se João Santana viajasse no tempo para o período anterior a 1789, ele teria ensinado a Luís XVI a distribuir uma parcela (muito) reduzida dos impostos arrecadados para a população mais humilde para ganhar o apoio desta, a culpar a classe média e o imperialismo britânico pelas mazelas destes humildes para defletir a atenção dos reais problemas estruturais.  Mesmo assim, invariavelmente a monarquia francesa não teria resistido, pois o marketing por si só não é um fim.  Que a cabeça dos nossos primeira e segundo estados terminem na guilhotina moral.  É hora da burguesia exigir os direitos que estão sendo usurpados de nós.

terça-feira, 10 de março de 2015

O Drama dos Satélites do Petrocentrismo



Enquanto a Operação Lava-Jato vai desenterrando todos os esqueletos imagináveis e inimagináveis na Petrobras e agora no “escalão de sacrifício” (vulgos bois de piranha) dos partidos de situação, as empresas de prestação de serviço e fornecimento que negociavam em grande escala com a Petrobras agonizam tentando escapar ou da justiça ou da falência ou de ambas.  Muitos têm criticado Sérgio Moro por estar causando danos irreparáveis a este setor da economia brasileira, mas isto seria uma causa ou uma consequência da Lava-Jato?  Falo por conhecimento próprio que a situação é terrível, profissionais bem qualificados e dedicados vislumbram o desemprego, se já não estiverem desempregados, e não conseguem enxergar qualquer porto seguro para atracar.  E não adianta nem cursar o Pronatec pois este está sem verba no momento!  Porém desde que comecei a trabalhar nesta área de projetos, sempre indaguei até onde poderíamos sobreviver neste “Petrocentrismo”.

Desde sempre, se considera como um mandamento divino que a Petrobras é um patrimônio do povo brasileiro.  Qualquer argumentação contra este mandamento e hordas de fanáticos hidrófobos acusam estes hereges de traição à pátria e de serem mancomunados do imperialismo americano.  Esta era uma visão em que a própria Petrobras já fez questão de discordar, pois lá na década de 90 a própria em propagandas institucionais deixava claro que era uma empresa de capital aberto cujo maior acionista era o governo federal.  Então para a própria empresa, a Petrobras não era do povo brasileiro e sim dos acionistas.  Até onde eu sei, alguém se torna acionista de uma empresa para ganhar dinheiro e não para fazer filantropia.

E aí reside o maior dos problemas da Petrobras, pois nem sempre é do interesse do acionista majoritário o lucro da empresa.  Nas administrações lulopetistas, a Petrobras claramente serviu a outros propósitos como o de alavancar setores da economia brasileiro que há muito tempos estavam estagnados.  Para aqueles que lembram da década de 80, a Lei da Informática serve de aviso que este tipo de incentivo é fadado a termos produtos e serviços dignos da qualidade dos finados CP 500 e TK 2000.  Foram criadas as empresas satélites do Petrocentrismo.

Nunca levei a sério a missão de uma empresa, sempre me deu a impressão que isto é frase pronta de algum “marqueteiro” que é pago mais dinheiro do que merece, mas a missão da Petrobras é “Atuar na indústria de petróleo e gás de forma ética, segura e rentável, com responsabilidade social e ambiental, fornecendo produtos adequados às necessidades dos clientes e contribuindo para o desenvolvimento do Brasil e dos países onde atua.”  Creio que a parte de “desenvolvimento do Brasil” tenha sido extrapolada pelas últimas administrações.

Como acionista minoritário, ênfase no minoritário, a Petrobras ao meu ver tem que extrair e refinar petróleo e vender os derivados de petróleo.  E só!  Mas sob a visão de Lula, a Petrobras passou a ter outras funções e veio a política de conteúdo nacional.  Entre 2005 e 2007, observei que as empresas de engenharia, prestadoras de serviço da Petrobras, não sabiam nem aonde contratar engenheiros no Brasil, eram selecionados sem critério qualquer um que tivesse um diploma de engenharia, mesmo que nunca tivessem atuado na área de projetos.  Imagino que outros prestadores de serviço e fornecedores tenham feito o mesmo.  Isso sem contar que a Petrobras foi usada para ressuscitar nossa indústria naval, mesmo que esta oferecesse produtos muito mais caros que os disponíveis no mercado globalizado.  Há realmente de se reconhecer que isto alavancou a carreira de muitos profissionais subutilizados no Brasil, mas esta solução “trivial” para os problemas extra-Petrobras tinha um custo que só foi se tornar claro mais tarde.

Aditivos contratuais eram concedidos aos satélites do Petrocentrismo a rodo.  Não era um objetivo primordial destes satélites de entregar um produto de qualidade mas sim de se fazer lobby para conseguir mais negócios com a Petrobras, que parecia muitas vezes um banco de investimentos – a fundo perdido!

Veio então a proclamação da auto-suficiência do petróleo e que com o pré-sal o Brasil seria um exportador de petróleo, isso lá nos idos de 2006.  Na época pré-Grande Recessão de 2008, tínhamos a impressão que finalmente as teorias de Thomas Malthus vingariam e os recursos naturais seriam cada vez mais escassos e valiosos.  Quem trabalhou em uma empresa de projetos de engenharia nesta época sabia que a demanda por mão de obra era enorme, engenheiros eram designados a mais de um projeto simultaneamente, e quase todos para a Petrobras.  Será que faltou visão naquela época que a Petrobras não poderia se expandir naquela velocidade para sempre?  E uma coisas sempre me preocupou, pois empresas que contratam sem critério são empresas que demitem sem critério.

Na euforia, faltou a visão que outros setores da economia estavam estagnados e o país, pelo menos o governo, tinha abandonado investimentos em uma matriz energética diversificada.  E os investimentos em infra-estrutura (PAC?) eram muito insuficientes para se atacar o problema do Custo Brasil.  O Petrocentrismo sempre foi e será um erro estratégico desse e de qualquer outro país.  Alguém pode me dizer qual o membro da OPEP que nós devemos se espelhar?  A companheirada se espelha na Venezuela...

E eis que em 2008, o mundo financeiro quase veio abaixo, a primeira “marolinha” que atingiu os satélites do Petrocentrismo foi relativamente fraca, mas contratos para novos projetos foram reduzidos, o que significava que a onda maior chegaria a nossas praias depois.  Em 2009, veio o esperado baque e houveram as demissões, mas logo em 2010 muitos dos que foram demitidos conseguiram se reposicionar no mercado.  O que poucos perceberam era que o tsunami ainda estaria para chegar.

Para mascarar a incompetência do governo Dilma, a Petrobras foi usada para conter sem sucesso a inflação.  O represamento do preço da gasolina serviu, além de minar a capacidade de investimento da Petrobras, para turbinar a onda gigante que atingiu em cheio o setor em 2014.  As atividades petrocêntricas já estavam desacelerando há algum tempo e os satélites do Petrocentrismo que não cortaram, começaram a segurar em seus quadros funcionários ociosos.  Também, o setor sucroalcooleiro foi duramente atingido por esta política suicida do acionista majoritário da Petrobras.  Este é um setor que poderia estar se expandindo resultando em demandas por serviços de engenharia, construção, e bem como compra de equipamentos.

Qualquer acionista por definição deve tomar atitudes gerenciais para garantir o lucro da empresa e a capacidade de investimento, ainda mais diante de um cenário em que a demanda por combustível estava aumentando.  A atitude do governo de Dilma, na capacidade de acionista majoritário, é por definição criminosa.  Quem foi inteligente o suficiente, vendeu as ações da Petrobras logo que George Soros abandonou o barco.  Era o alerta que a coisa ia piorar rápido.

Pois bem, toda essa conjuntura mal tocou no principal problema da Petrobras: a corrupção.  A ganância desenfreada dos saqueadores tirou o dinheiro que deveria ser investido em novos projetos, afetando, além dos satélites petrocêntricos, os clientes que são a população brasileira que compra gasolina e os acionistas.  Os únicos que não são afetados são os funcionários, pois estes possuem estabilidade de facto na empresa.  Longe de querer que trabalhadores percam seu emprego, mas claramente a Petrobras tem seus quadros inchados, tanto que recentemente procurou fazer um programa de demissão voluntária.

Então que culpa tem o Sérgio Moro nesta estória?  A de exigir que o contribuinte, que vai arcar de uma forma ou outra os abacaxis da empresa, tenha justiça?  A de exigir que o acionista possa ter seus direitos respeitados?  Ou será que o acionista é a elite branca burguesa que paga propina ao guarda de trânsito e então tem que ser esfolada?  A política de uso da Petrobras para outras finalidades que não a de produzir derivados de petróleo causou o aparelhamento da empresa por indivíduos mais preocupados com ideologia do que com a empresa, que geraram corrupção e ineficiência, que por sua vez causou a derrocada da Petrobras.  E esta é a causa de todas as empresas de engenharia, empreiteiras, fornecedores de equipamentos e outras estarem passando o pires.  E sim, nós engenheiros estaremos de volta a vender suco.  Simplesmente lastimável.

quinta-feira, 5 de março de 2015

O Voto de Edmund Ross



Poucos vão saber quem foi o americano Edmund Ross, um senador republicano do estado do Kansas que em maio de 1868 teve em suas mãos o destino daquela nação.  O auge da carreira de Ross foi no senado, para qual não foi eleito mais após esse mandato no qual mudou a história americana.

Muitos vão lembrar que em 1998 Bill Clinton sofreu impeachment na Câmara dos Representantes, equivalente à Câmara de Deputados brasileiros, mas foi absolvido no senado, uma vez que eram necessários 67 votos de 100 senadores para destituírem Clinton e só 50 votaram a favor desta destituição.  A acusação contra Clinton era de perjúrio e obstrução da justiça, uma vez que o popular e até certo ponto folclórico presidente teve suas aventuras extra conjugais escancaradas na mídia após negá-las sob juramento.  Todo este imbróglio teve motivações políticas mas os congressistas republicanos não conseguiram minar o presidente democrata.

O que poucos vão lembrar é que este não foi o primeiro presidente americano a sofrer impeachment e que a primeira ocasião teve contornos muito mais dramáticos e com possíveis consequências drásticas caso Ross agisse de maneira diferente do que agiu. 

Em 1864, os Estados Unidos da América estavam imersos na sangrenta Guerra Civil no qual os Estados Confederados da América, formado por estados separatistas do sul americano, se opunham ao norte que sob o comando de Abraham Lincoln, o presidente que aboliu a escravidão naquele país.  A guerra civil caminhava para uma vitória da União contra a Confederação, mas existia o risco do republicano Lincoln não ser reeleito, curiosamente o seu adversário naquele ano foi um dos seus principais generais na guerra, George McClellan.  Pensando em uma futura reconciliação com os estados separatistas, Lincoln resolveu substituir em sua chapa o então vice-presidente Hannibal Hamlin, pelo democrata Andrew Johnson, um sulista que não apoiou a Confederação.  Lincoln ganhou a eleição e os EUA aprenderam que é bom tomar cuidado com quem é eleito vice-presidente.

Andrew Johnson nasceu pobre no estado do Tennessee, logo ficou órfão, não teve muita escolaridade e se tornou aprendiz de alfaiate na adolescência.  Mas Johnson era um sujeito determinado e procurou se auto-instruir e logo conseguiu abrir seu próprio negócio como alfaiate, e com sucesso.  Ingressou na política local, sendo que era conhecido por ter um discurso bem-sucedido com a população local mais humilde, a plebe como ele mesmo denominava.  Antes do início da guerra, no qual o Tennessee fazia parte da Confederação, Johnson foi eleito primeiro governador e depois senador.

Após a eleição de 1864, veio o prenúncio dos problemas quando, em seu discurso inaugural, Johnson se dirigiu ao Congresso bêbado.  E em 1865, Lincoln foi assassinado, numa trama que também alvejou Johnson, apesar dos teóricos da conspiração discordarem e alegarem que o próprio Johnson seria um mandante do assassinato.  Com o fim da Guerra Civil, o vitorioso norte queria ditar condições aos participantes da Confederação e eis que a veia sulista de Johnson veio à tona e ele não procurou nem conceder muitos direitos aos recém-libertos escravos e nem procurar uma punição mais rigorosa aos seus conterrâneos separatistas.  Foi o suficiente para enfurecer os republicanos que começaram a se mexer para destituir Johnson.

As eleições legislativas de 1866 foram determinantes para a desgraça de Johnson, pois os estados do sul estavam exclusos desse evento e o norte elegeu para o congresso americano mais de 2/3 de republicanos .  Isso auxiliado pelos vários discursos públicos desastrosos do destemperado Johnson que insistia em trocar insultos com aqueles que o afrontavam.  O novo Congresso era ainda mais hostil em relação a Johnson e resolveu minar sua autoridade criando o Ato da Estabilidade  (Tenure Act) em 1867.  Este ato simplesmente impedia o presidente de demitir um ministro sem a autorização do senado.  Simplesmente era uma lei que colocava o Poder Executivo de joelhos diante do Legislativo, e sob certa ótica era um passo importante em transformar os EUA em um regime parlamentarista.  Johnson resolveu enfrentar o congresso e fez de tudo para demitir seu desafeto Edwin Stanton, Ministro da Guerra indicado por Lincoln.  O congresso retaliou e abriu processo de impeachment contra Johnson pela demissão de Stanton, e a Câmara dos Representantes por 126 a 47 votos ratificou o impeachment. 

Era necessário, porém, que pelo menos 2/3 do Senado americano votassem pela destituição de Johnson.  No julgamento no senado, os advogados do presidente conseguiram o convencer a falar o mínimo possível, pois ele já havia dado todas as demonstrações imagináveis que poderia se enforcar sozinho com suas declarações.  Em um senado de maioria esmagadora republicana, mais de 2/3 das cadeiras, a derrocada de Johnson parecia certa.  Porém, alguns poucos senadores republicanos entenderam que apesar de sua presidência desastrosa, não havia um motivo para destituí-lo do cargo e que o Ato da Estabilidade era inconstitucional como Johnson alegava.  A votação terminou em 35 a 19 a favor de sua destituição, ou seja faltou 1 voto apenas.  Esse voto era para ter sido dado por Edmund Ross que não aceitou as alegações de seus partidários.  Ross e outros 6 senadores republicanos mantiveram o equilíbrio entre os 3 poderes.  Se foram corrompidos ou se acreditaram que não caberia ao Legislativo usurpar o poderes do Executivo, isso só eles poderiam responder.  No final, Johnson sequer conseguiu ganhar as primárias do Partido Democrata para a eleição de 1868, mas foi depois eleito senador novamente pelo Tennessee, Ross não se reelegeu senador e em 1887 o Ato da Estabilidade foi considerado inconstitucional pela Suprema Corte americana.  Para vários historiadores, Johnson é considerado um dos piores presidentes da história americana.

Comparando Johnson a Dilma, pode se enxergar várias semelhanças e diferenças.  Como Johnson, Dilma perde a oportunidade de ficar calada em vários momentos, ambos chegaram à presidência por méritos de outros e enfrentaram um congresso hostil.  As diferenças são que mesmo os EUA atravessando um período de guerra não estavam à beira do precipício econômico; Johnson por méritos próprios ascendeu de menino pobre para alfaiate bem sucedido e depois para um político eminente de seu estado, enquanto Dilma fracassou como assaltante de banco e gerente de loja de R$1,99; o congresso hostil a Johnson era formado pela oposição, e Dilma enfrenta aliados descontentes e oposição. 

Impeachment é um processo político e não um processo judicial.  Fernando Collor só caiu pois o nosso congresso vislumbrou um ganho político em derrubá-lo.  A baixa popularidade de um presidente é sempre um incentivo a processos de impeachment.  Neste momento, o PT está cogitando rifar Dilma para ela não destruir as chances do partido em 2018, o PMDB vislumbra uma oportunidade de conseguir mais poder e o PSDB e oposição parecem que timidamente vão agir como oposição e que é possível que uma atitude semelhante a de Edmund Ross não será tomada, como foi feito em 2005 por Fernando Henrique Cardoso no caso do mensalão.  Dado as condições favoráveis, como clamor popular, o congresso encontrará motivos ou pretextos para o impeachment de Dilma.

Os EUA tiveram em quase 250 anos de regime presidencialista apenas 2 presidentes impedidos, quase 3 se formos considerar Richard Nixon e o Watergate, enquanto nós podemos ter 2 processos de impeachment em 25 anos!  Fica a lição para o povo brasileiro escolher melhor seus candidatos.