sexta-feira, 2 de março de 2018

Enfrentando a Juniorização

A vida começa depois dos 40!  Esta é uma frase um tanto disseminada para animar aqueles que adentram os 40 anos tentando fazê-los diminuir o foco na juventude que vai ficando para trás.  Conheço gente que sente bastante saudades de outras épocas e outros que fazem vários planos para a segunda metade da vida, afinal o tempo é implacável e não adianta muito olhar para trás mesmo. Em outras épocas, a idade dos 40 era razoavelmente avançada, uma vez que o tratamento para enfermidades era bem precário e os constantes conflitos bélicos entre as nações reduziam significativamente a expectativa de vida da população.  Hoje temos tratamentos bem eficazes para doenças que antes eram letais, e desde 1945 não há um conflito de grandes proporções que resulte em milhões de mortos, como foi a Segunda Guerra Mundial.  Isso traz alguns novos (ou nem tanto) desafios para os "quarentões" que vislumbram muitas vezes quase meio século a mais de vida pela frente.  Entre estes desafios estão aqueles da vida profissional já que a aposentadoria nesses tempos modernos está sendo empurrada para a casa dos 70 anos por necessidade.

O derradeiro debate entre os dois candidatos à presidência em 2014 foi marcado pela pergunta de Elisabete Timbó, uma economista de 55 anos, que queria saber que medidas os candidatos pretendiam tomar para auxiliá-la já que estava há 2 anos sem emprego, situação comum a vários outros brasileiros.  Enquanto Dilma sugeriu de maneira obtusa e até mesmo cínica que obtivesse uma qualificação maior fazendo um curso no PRONATEC, Aécio Neves argumentou que primeiro era necessário resolver problemas macroeconômicos para que a economia crescesse para que houvesse geração de empregos qualificados.  Por mais sensata que tenha sido a resposta de Aécio, em específico se for comparada com a bobagem (mais uma) proferida por Dilma, esta é uma resposta um tanto evasiva que não aborda um problema que a macroeconomia tem impacto menor na carreira do profissional mais maduro do que Aécio inferiu.

Empresas que se tornam grandes conseguem isso porque em algum instante souberam se organizar adequadamente, inclusive no que diz respeito ao seu organograma.  Dificilmente veremos uma empresa de mais de 1000 funcionários ter uma razão de subalternos para gerentes (ou supervisores) pequena, se isso ocorrer, recomendo sair logo, pois não só está fadada ao fracasso como o ambiente de trabalho deve beirar o insuportável.  Isso significa que empresas bem-sucedidas possuem um afunilamento considerável na sua estrutura, mantendo assim uma maior agilidade em tomadas de decisões estratégicas e uma folha salarial em patamares saudáveis.  Ascender verticalmente em um organograma não é fácil, e nem deveria ser, o que tem um efeito sensível no horizonte profissional dos funcionários da empresa.  Há aqueles que com a experiência, adquirem um considerável conhecimento técnico e, mesmo não gerenciando subalternos, passa a ser responsável por certas decisões táticas.  É a notória carreira em Y.

Naturalmente, a cada ano as universidades formam vários novos profissionais na casa dos 20 anos que procuram o seu primeiro emprego, isso sem contar aqueles que se formam já empregados.  Salvo situações em que a economia cresce significativamente, a entrada dessa nova geração de profissionais só é possível se as empresas abram novas vagas a partir da dispensa de funcionários mais velhos.  Este processo é apelidado de juniorização.  No Brasil atual, a juniorização ganhou ares de irresponsabilidade com a substituição de pessoas chaves em um organograma por funcionários pouco qualificados mas que aceitam menores salários, o que agrava a situação desses funcionários mais velhos.  De qualquer maneira, essa reciclagem nas empresas é mais do que esperada, por mais cruel que possa parecer.  Sobra o desafio de profissionais de mais de 40 anos, como a Sra. Timbó, de como fazer para sobreviverem à juniorização ou à reciclagem.

Quando se formamos de um curso superior, é bem comum o contato para realizarmos as fatídicas dinâmicas de grupos para preenchermos as vagas na base do organograma de uma empresa.  Normalmente, os melhores recém-formados vão atrás de vagas em grandes empresas, pois estas possuem planos de carreira, ou pelo menos alegam possuir.  Depois dos 30 anos, esses contatos são menos frequentes, a mobilidade entre empresas ocorre por networking, ou seja contato com outros profissionais.  Redes sociais com perfil profissional, como o LinkedIn, facilitam este networking e a migração de profissionais entre empresas.  Depois dos 40 anos, a situação fica mais complicada.  Esses contatos ficam cada vez mais escassos, exceto para aqueles que conseguem sobreviver ao afunilamento natural na empresa.  Muito se alega que há preconceito com profissionais com mais idade para funções mais prosaicas, mas há um certo mérito na procura de um perfil de profissionais mais jovens.  Na teoria estes tem mais energia e disposição para o trabalho, sem contar que aceitam salários menores.

Aqui começa o desafio dos quarentões juniorizados ou a ponto de serem juniorizados.  No Brasil, há um agravante que decorre do efeito deletério dos vários aumentos salariais impostos por dissídios.  Como este aumento é obrigatório as empresas, funcionários com mais tempo de casa tem salários maiores e se não tiverem uma produtividade condizente com o salário serão fatalmente alvo de demissões, salvo é claro algumas exceções.  Outros problemas apresentados por funcionários mais velhos são a acomodação, a desmotivação por eventual estagnação e a falsa sensação que são parte integrante e insubstituível da empresa.  Muitos funcionários mais velhos quando percebem que vão sucumbir ao afunilamento ainda por cima preferem esperar a demissão ao invés de procurarem outro emprego.  Este é outro efeito deletério das leis trabalhistas brasileiros, pois incentivam estes funcionários a esperarem por pacotes de demissão que a curto prazo são polpudos, mas a médio prazo podem minar a carreira destes.

Como funcionários mais velhos ganham naturalmente mais que os mais novos, empresas ficam mais do que tentadas a juniorizarem seus cargos.  Do outro lado, conheço desempregados que recusaram trabalhos por considerarem o salário oferecido não digno à sua formação e experiência.  Muitas vezes empresas exploram mesmo as adversidades de um profissional desempregado oferecendo não só um salário ruim, mas como um trabalho igualmente ruim.  Recusar a oferta é um direito deste profissional, mas este corre o risco de ficar fora do mercado de trabalho por tempo alto, o que reduz significativamente a chance deste se recolocar.  Outros profissionais até aceitam salários reduzidos, mas algumas empresas desconfiam que este profissional queira só minimizar o prejuízo e vá procurar outro emprego logo que seja contratado, o que é bem comum.

O que fazer então?  Uma possibilidade é uma mudança de carreira, o que não é fácil. O profissional deve não só encarar uma mais do que provável redução salarial como também ter a humildade de encarar um aprendizado intensivo decorrente desta mudança.  Sem contar que nem todas as carreiras aceitam estas mudanças facilmente, o empregador pode preferir evidentemente um recém-formado a um quarentão aberto a novas experiências.  Outra possibilidade, muito comum neste país, é o profissional virar concurseiro e tentar ingressar no funcionalismo público.  Concursos tem como característica não fazer nenhuma distinção dos candidatos quanto à idade, aliás em alguns o critério de desempate é justamente o de maior nota.  Porém concursos não são fáceis e diante de um quadro de déficit primário, espera-se que o governo tenha o bom senso de contratar novos funcionários se e somente se for necessário isto. Uma das alternativas mais populares é a do profissional investir o dinheiro da rescisão em algum negócio como restaurantes, comércios e serviços.  Alguns dão certo, muitos perdem dinheiro que não tem.  Tocar um negócio não é fácil e muitas vezes exige mais dedicação que aquela dispensada no emprego anterior.

Na minha humilde visão, uma alternativa que torna viável o emprego destes quarentões, cinquentões e sessentões vítimas da juniorização são vagas em pequenas e médias empresas.  Nestas empresas o plano de carreira é extremamente limitado, mas muitas vezes um profissional mais experiente é aquele que é ideal para a empresa.  O perfil de vaga muitas vezes exige o desempenho de funções mais mundanas, mas também exige conhecimento que recém-formados não têm.  Funcionários novos podem procurar rapidamente sair de empresas sem possibilidade de carreira, mas outros mais velhos podem aceitar essa realidade.  Basta o profissional juniorizado ter humildade e não possuir ego frágil.  Algumas dessas empresas são verdadeiras armadilhas, digo isso por experiência própria, que tirarão a saúde mental do profissional, mas outras são boas de trabalhar.  O salário pode até ser inferior àquele pago anteriormente, mas é infinitamente maior que zero, e tempo dispensado ao trabalho é algumas vezes inferior aquele necessário para a aventura de um negócio próprio.  O aproveitamento destes profissionais depende muito destes não serem presunçosos e presos a um passado que pode nunca voltar.

Sim a economia tem que crescer para que mais oportunidades surjam, mas também é necessário neste país uma sensível desburocratização e incentivo ao empreendedorismo.  No momento, o Brasil é o país onde é lucrativo ter um cartório e empresários são considerados por muitos como exploradores dos trabalhadores.  Para que os quarentões possam sobreviver no mercado de trabalho com mais dignidade, é hora de se mudar esta visão.

quarta-feira, 13 de dezembro de 2017

Cenário de Incertezas e Ameaças

Recentemente, alguns indicadores econômicos têm mostrado que a economia brasileira entrou nos eixos.  Realmente, a inflação está abaixo de 3,0% anuais, a bolsa está oscilando em um patamar acima dos 70.000 pontos, algo não visto há anos, a taxa de juros caiu para abaixo de 8,0% e o PIB mostra um tímido crescimento.  Esses números eram até esperados pela simples saída de Dilma Rousseff e toda a sua infinita incompetência do planalto.  Bastou alguém com um mínimo de respeito a pilares macroeconômicos que foi possível reverter a trajetória de queda.  O mercado brasileiro mostrou certa resiliência, mas ainda é muito cedo para comemorar.

Os números preocupantes e que os investidores, diretamente ou via agências de risco, estão de olho são outros.  O nosso déficit primário está acima de 1% do PIB, o fiscal é astronômico e beira os 9% e a dívida pública se aproxima de 80%.  Qualquer um que saiba o mínimo de economia sabe que essa situação é insustentável e o Brasil caminha no médio prazo para a insolvência.  É preciso estancar a hemorragia de qualquer maneira para reverter este quadro.  Ou o Brasil aumenta a arrecadação, que seria resultado de um crescimento do PIB bem maior que o tímido atual, ou diminui os gastos.  Para o PIB crescer, o Brasil precisa de mais investimentos, o que é desestimulado diante do quadro de alto endividamento e classificação de risco ruim.  Precisaria cortar gastos e aí o buraco é bem embaixo.

Graças a uma constituição equivocada em vários pontos, o Brasil rapidamente comprometeu o seu orçamento em gastos chamados de incompressíveis.  O maior de todos é o com a previdência.  Pessoalmente, sou a favor de não contribuir com o INSS ou qualquer outra entidade que compulsoriamente tome parte do meu salário para me dar um retorno muito duvidoso no futuro.  Mas somos um país de cidadãos que exigem tutela de governos incompetentes.  Essa tutela é ótima para uma parcela de privilegiados do funcionalismo público que recebem fábulas da aposentadoria, mas ruim para a maioria que recebe uma mixórdia do INSS e ainda defende este.

Independente da eficiência do INSS, é necessário reformar nossa previdência e as demonstrações são que o congresso não é muito propenso a isto.  Se Michel Temer não conseguir aprovar esta reforma, seu sucessor será obrigado a fazer isto, na teoria.  Não ouço nenhum candidato ou pré-candidato falando abertamente em reformar a previdência, pior não ouço nenhum comentando da situação de penúria de nossa dívida pública.  A irresponsabilidade impera da esquerda para a direita neste país.  Por termos uma população que em sua maioria exige tutela, nenhum candidato falará abertamente sobre isto.  Preferem falar em direitos ameaçados, provavelmente os marqueteiros políticos instruem seus clientes a serem razoavelmente populistas.  Outros como Lula, são abertamente populistas e irresponsáveis, mas de vez em quando tem um marqueteiro que manda ele soltar umas frases sobre responsabilidade fiscal para tentar atrair algum investidor incauto.  Estes estão em falta no atual momento.

No espectro da direita, tem o pré-candidato Jair Bolsonaro, que não é bem de direita mas por defender punição mais dura (e necessária) aos bandidos é considerado de direita.  Porém suas ideias sobre economia são altamente equivocadas.  Defende o que a esquerda defende, intervenção no mercado, controle do Banco Central, proteção a estatais, etc.  Recentemente, veio com um papo liberal econômico para tentar atrair os investidores incautos que Lula também tenta atrair.

O PSDB que tem tido um número considerável de votos nas últimas eleições, mais por falta de opção na política que por convicção, mostra sua toda tradicional postura de indecisão.  Irrita o mercado financeiro, eleitores de direita e de esquerda igualmente.  Não consegue montar uma estratégia que passe certeza que vai tratar do descalabro econômico adequadamente.

Em suma, no atual cenário, está difícil de se escolher alguém, pois ou prometem ser irresponsáveis ou não prometem nada na esperança que os eleitores adivinhem o que vão fazer.  O problema é que ameaças de irresponsabilidade ganham votos.  Prometer torrar dinheiro, que não existe, com mais investimentos ruins e mais programas sociais ineficientes dá voto.

Além da bomba previdenciária, há outros pontos que ninguém toca.  O Brasil precisa privatizar o restante das estatais que são verdadeiras tentações para se criarem esquemas de corrupção.  Petrobras, Banco do Brasil, Caixa Econômica e Eletrobras deveriam ser todas privatizadas.  Funcionários públicos deveriam estar sujeitos às mesmas regras de mercado, isto é, não ter estabilidade quase que inquestionável e com certeza se sujeitarem a análises de desempenho para justificarem seus empregos.

Um discurso que abordasse este tema certamente seria bem visto pelo mercado financeiro.  A implementação destas medidas iria arrefecer os ânimos dos investidores.  Só que aí entra o populismo que infere que estas medidas são a favor dos ricos e contra os pobres.  Falta alguém dizer que se não conseguirmos atrair investidores não conseguiremos pagar a dívida pública, se não pagarmos a dívida pública a economia vai à lona.  Primeiro por que só fecharemos as contas fatalmente imprimindo dinheiro, ou seja com inflação, e que os maiores credores da nossa dívida pública são fundos de pensão nacionais.  Em outras palavras a crise previdenciária afeta a própria aposentadoria da população brasileira.

Então fica mais um dilema Tostines: os candidatos são irresponsáveis por que a população quer ouvir propostas populistas, ou a população só ouve propostas populistas por que os candidatos não se atrevem a falar a verdade?  Não tenham dúvidas, se nada mudar, 2018 será recheado de ameaças e o nosso futuro será bem incerto.

segunda-feira, 31 de julho de 2017

Saúde para (Quase) Todos

O filme esquerdófilo de 2013 Elysium, devidamente estrelado por Matt Damon, Alice Braga e Wagner Moura, tratava de um futuro onde uma casta de ricos que viviam no Elísio, situado em órbita terrestre, tinha acesso a uma tecnologia de ponta que tratava de qualquer enfermidade que os membros da casta poderiam sofrer.  Max após receber uma dose letal de radiação tem que entrar em Elísio para se curar.  Debaixo de um monte de maniqueísmo, o filme aborda alguns aspectos interessantes.

Mesmo entre os direitistas, existe um consenso que o governo deve cuidar da saúde de sua população.  Conheço uma mãe solteira cuja criança teve a infelicidade de ser alérgica à proteína do leite.  A lata de leite em pó adequada para crianças com este tipo de intolerância custa mais de R$500,00, mas, felizmente, o governo fornece gratuitamente este leite.  Via dinheiro dos impostos dos contribuintes, é claro.  Desde que esse tipo de tratamento seja restrito a poucos casos, não há mal em a população ser solidária com a mãe e a criança, afinal a ajuda ao próximo não é um lema exclusivo da esquerda.  O problema seria quando houvessem vários casos dessa alergia.  Nesse caso o custo repassado à sociedade seria maior, ao ponto de vários não poderem ajudar e da solidariedade se tornar um sacrifício insustentável.

Mas a conta da saúde não é alta devida a enfermidades raras e sim devido a uma miríade de necessidades dos cidadãos em virtude de estarem simplesmente vivos.  Faço anualmente uma bateria de exames que o meu clínico geral requisita para o meu check-up.  Obviamente, este custo é coberto pelo meu plano de saúde que mensalmente me esfola com uma cobrança salgada.  Duvido que todos os participantes tenham o cuidado que tenho ou que até procurem um tempo para efetuarem estes exames, mas se todos tiverem o plano certamente cobrará mais caro de todos.  Não há segredo e nem milagre, na média o participante do plano de saúde tem que gastar mais por ano com este plano do que o plano gastar com as despesas médicas do participante.  Caso isto não ocorra, o plano vai certamente à falência.  Se alguém conseguisse saber com precisão os gastos futuros com saúde, este poderia até dispensar o plano de saúde e fazer uma poupança para estes gastos e economizar um bom dinheiro.  Infelizmente os imprevistos podem sair demasiadamente caros e nesse caso é bom contar com a cobertura do plano de saúde.  Ou melhor, com o dinheiro dos demais participantes do plano de saúde.  Não adianta demonizar os administradores de planos de saúde, embora alguns devidamente mereçam, o preço de um plano é determinado pela necessidade média dos participantes com gastos de saúde.

Para aqueles que não estão participando de planos de saúde voluntariamente, no Brasil há a adesão (obrigatória) ao plano de saúde "invisível" e caro conhecido como o SUS.  Já fiz uso do SUS e sou testemunha que alguns hospitais são até melhores que particulares que atendem exclusivamente a participantes de plano de saúde.  Mas não há como negar que o SUS não dá conta das demandas da população.  É constante se ouvir de qualquer político que este vai melhorar o SUS e assim o brasileiro em média terá melhor atendimento médico.  Em 13 anos o PT fez um estrago considerável ao SUS, basta checar qualquer estatística da saúde brasileira, como o número de leitos para pacientes, mas não planejo sair do meu plano de saúde para ficar só com o SUS.  A verdade é que dificilmente a conta da saúde vai fechar no Brasil ou até mesmo em qualquer país do mundo.  Conheço suecos que vêm ao Brasil procurar tratamentos médicos e dentários com médicos particulares porque na Suécia, um welfare state, a fila de espera é de anos para se requisitar um tratamento deste.  Não preciso nem procurar dados, mas afirmo que em média o sueco tem melhor acesso à saúde do que o brasileiro.  Porém, a centralização e estatização completa da saúde cria aberrações como esta evasão.

A verdade é que quem tem recursos vai usá-los para sua saúde sempre.  Existem profissionais e empresas que sempre oferecerão serviços e produtos para aqueles dispostos a gastar, inclusive no setor da saúde.  No momento que se tentar "distribuir ou socializar" estes serviços e produtos, estes passarão a perder qualidade.  A "socialização" de tratamentos caros só funcionará enquanto poucos precisarem destes tratamentos.  Por outro lado, um investimento "socializado" da saúde na população geral é necessário até mesmo para se minimizar prejuízos para a sociedade como um todo.  Graças a campanhas maciças de vacinação, a humanidade erradicou doenças como pólio e varíola, sem contar que minimizou-se o número de enfermos com sarampo, difteria e outras doenças.

Ninguém deve se iludir que o custo de saúde é pequeno, muito pelo contrário.  No futuro próximo este custo tenderá a crescer justamente pelos avanços da medicina.  Estes avanços permitirão o cidadão médio a viver mais anos, muitos deles em faixas etárias no qual poucos são abençoados de viverem sem problemas de saúde.  E este custo não se resume a só o quanto de dinheiro é gasto em tratamento de doenças como câncer, diabetes e degenerações como mal de Parkinson ou Alzheimer, mas sim no tempo que cidadãos (mais) saudáveis dispensarão para cuidar de um número crescente de enfermos.  Cada profissional, ou mesmo alguém altruísta, que cuida de pessoas com problemas crônicos ou incuráveis é uma pessoa que não estará produzindo.  Devemos lembrar que os gastos da saúde só serão cobertos se a sociedade como um todo ganhar mais.

No futuro, é possível que a tecnologia possa baratear significativamente os custos de saúde, mas no momento estes estão se tornando um problema complexo e custoso para a humanidade.  A celeuma de Trump com o Obamacare mostra que este é um problema universal e sem solução definida.  Nós temos que ter a consciência de não esperar de ninguém os cuidados com nossa saúde, e sim tomar as providências para isto.  Desde os conhecidos hábitos saudáveis até mesmo a reservar uma boa parte das economias para os imprevistos que infelizmente podem nos acometer.

terça-feira, 27 de junho de 2017

Em Defesa dos Direitos Trabalhistas



O amadurecimento de cada profissional vem, se vier, cedo ou tarde.  No segundo caso, o profissional seguramente vai apanhar um bocado para atingir um certo grau de amadurecimento.  Já tive minha época de apanhar um bocado para aprender o óbvio.  Certa vez, fui alocado, a contragosto, em um projeto ruim debaixo de um supervisor inepto.  A mistura de liderança incompetente com subalterno desmotivado é uma receita certa para resultados ruins e desgastes de ambas as partes.  Após uma discussão acalorada com este supervisor, fui interpelar minha chefia, que havia me “emprestado” ao projeto em questão, do tratamento dispensado a mim.  Ouvi de maneira polida que poderia escolher me demitir.  Este foi um momento de humilhação e aprendizado, pois resolvi engolir meu orgulho e continuar trabalhando.  Foi uma experiência interessante, uma vez que em quase 2 meses, troquei no máximo 2 frases com aquele supervisor, que queria se livrar de mim mas não conseguiu.  Foi um momento importante na minha vida profissional, no qual passei a ter outra atitude e postura como empregado.  A verdade é que quem emprega de uma maneira ou de outro tem o direito de fazer exigências e cobranças dos empregados, e não o contrário.  Claro que há limites que ninguém pode ultrapassar, não se pode assediar um empregado ou colocá-lo em risco.  Se bem que essas definições de assédio e risco são bem voláteis em algumas disputas trabalhistas.

A realidade é que a melhor defesa de um empregado tem para se defender de um empregador abusivo é o direito de se demitir.  E hoje em dia, existem sites como o Glassdoor que permitem avaliar os empregadores avisando assim os incautos do que lhes espera caso aceitem a contratação por estes.  Já trabalhei para uma empresa que tinha uma avaliação horrenda no Glassdoor, o que levou a empresa a tomar medidas para melhorar a nota.  Nesse caso, as medidas foram “incentivar” empregados a escreverem resenhas positivas e ameaçar com processo os ex-funcionários que postassem alguma resenha negativa.  O empregador que ao invés de se preocupar em melhorar o ambiente de trabalho resolve maquiar as avaliações é um fadado a transformar o negócio dele em um fracasso.  Aturei trabalhar lá por mais tempo que devia por dois motivos, o primeiro era que não queria ter no meu currículo um emprego que fiquei por alguns meses e o segundo era que não havia empregos para mim no mercado.  Após uma insistente busca, consegui mudar de profissão e pedir demissão sem medo de me tornar um desempregado crônico.  Não escrevi nenhuma resenha no Glassdoor, pois o próprio mercado se ocupou em punir esta empresa que perdeu faturamento e encolheu significativamente.

A situação que atravessei não é exclusiva a mim e é mais do que atual diante da grave recessão que o Brasil se encontra.  Quem está empregado é submetido a condições desagradáveis e até humilhantes por receio de ficar desempregado, e quem está desempregado se submete a empregos de baixa remuneração e ruins para poder sair do sufoco.  Diante de circunstâncias econômicas adversas, os empregadores têm dificuldades de contratar.  O gasto despendido com os empregados devem ser obrigatoriamente compensados pelos ganhos obtidos com o negócio.  Em épocas de “vacas magras”, mesmo diante deste cenário de ganhos reduzidos, os empregadores para empregar ou manter os empregados são submetidos a exigências custosas para criar ou manter empregos.  A solução neste caso é simples: não contratação e demissão.  Os empregos ofertados acabam sendo de empresas que deveriam ter a pior das avaliações no Glassdoor.

Por exatos 10 anos, minha CLT ficou tomando pó em uma gaveta.  Tive boas experiências com empregadores que me davam ampla liberdade de como trabalhar, tendo como contrapartida a apresentação de um bom trabalho e respeito às exigências destes empregadores.  Não se pode generalizar, mas a experiência da livre negociação se mostrou muito boa no meu caso.  Alguns desses empregos não ocupavam mais que dois dias em uma semana e podiam ser feitos em home office, assim possibilitando que eu pudesse procurar outras oportunidades ou até mesmo de desfrutar de um maior tempo livre.  Normalmente, por motivos de necessidade de uma sinergia no ambiente de trabalho, faz-se necessário que sejam observados os horários comerciais tradicionais e a presença em um local comum de trabalho.  Mas há necessidades dos empregadores e oportunidades que não exigem isso.  A criação de dificuldades para se contratar profissionais para estas situações é simplesmente inaceitável.

As dificuldades da criação de empregos muitas vezes são resultados de uma aliança sinistra de governo com sindicatos.  Quanto mais esses dois apertam mais os empregadores, mais empregos são destruídos ou mais dribles das leis trabalhistas são realizados.  Nos EUA, o governo de Donald Trump resolve atacar os imigrantes, em específicos os mexicanos, como se estes fossem os responsáveis pelo desemprego de vários americanos.  O que Trump não entende, ou finge não entender, é que muitos mexicanos estão sendo empregados nos EUA por não fazerem exigências que muitos americanos fazem e que os empregadores não aceitam.  Aqui no Brasil, o país da criatividade jurídica e administrativa, cria-se cada vez mais postos para pessoas jurídicas ou até mesmo contratações informais.  Quase metade dos trabalhadores brasileiros não estão enquadrados na CLT.  Está mais do que na hora de se fazer uma reforma trabalhista para se acabar com este tipo de aberração.

A situação de pleno emprego não é desejada em alguns países pois pode até ser um foco de inflação devido ao aumento do salário real.  Também, neste caso, os empregadores passam a ser reféns dos empregados e suas exigências, que passam a ser atendidas.  O Brasil está longe do pleno emprego, mas muitos fazem toda sorte de exigências para trabalhar.  Quem contrata nesta situação?

quarta-feira, 31 de maio de 2017

Nem Clark Kent, Nem Lex Luthor

As estórias de heróis e seus respectivos cultos têm origem no início da civilização.  As mais conhecidas são as da Grécia Antiga, como a do semi-Deus Hércules que entre várias tarefas derrotou diversos inimigos  como Cérbero, o cão de três cabeças guardião do inferno.  Este não era o único herói da mitologia grega, outros famosos são Perseu que matou a Medusa e Teseu que aniquilou o Minotauro.  Todos estes heróis derrotaram nas estórias seres mitológicos de poderes sobrenaturais que eram a encarnação do mal.  Estas conquistas não poderiam ser repetidas por meros mortais e, portanto, só heróis teriam como obtê-las.  Os gregos, porém, criavam seus heróis com traços mais humanos, falíveis e, portanto, passíveis de lapsos como qualquer humano.  Até os deuses gregos tinham características humanas e eram vulneráveis a sentimentos como inveja, ganância e amor.  Outras civilizações durante a história também criaram seus herói como o Rei Artur, Beowulf, Guilherme Tell, entre outros.  Aliás, muitos destes heróis mitológicos foram pessoas normais que conseguiram feitos impressionantes e devidamente exagerados por aqueles responsáveis pelo registro histórico destes.  Os mais céticos alegarão que religiões foram criadas de maneira similar.

O Século XX viu o nascimento dos gibis dos super-heróis, resultando na "guerra" entre a Marvel e a DC Comics.  Esta última criou talvez o mais famoso dos super-heróis, o Super-Homem e seu alter ego Clark Kent, em 1938.  Quem viveu a década de 1970 certamente vai lembrar do filme de 1978, estrelado pelo saudoso Christopher Reeve no papel do herói e Gene Hackman no papel do arqui-inimigo Lex Luthor.  Este é o filme do Super-Homem que me marcou, pois não me entusiasmei com as tentativas de reboot estreladas por Brandon Routh e Henry Cavill.  O retrato de 1978 de Clark Kent era de um sujeito normal dotado de uma bússola moral ímpar que sempre o guiava na luta contra seus inimigos, como Luthor.  Este era retratado de maneira até cômica por Hackman, mas no fundo era um personagem inescrupuloso capaz de matar milhões por especulação imobiliária.  Olhando para trás, vejo que o que mais me incomodava nas estórias de heróis, em específico as do Super-Homem, era como os humanos comuns eram retratados.  Nós, meros mortais, nestas estórias, éramos sempre incompetentes para lidarmos com nossos problemas.  Os criminosos aterrorizavam a população sem que as autoridades fossem minimamente capazes de controlá-los, e até mesmo quando estes criminosos eram presos, eles escapavam de maneira muitas vezes fácil.  Esse retrato da inépcia humana é até ofensivo, mas muitas vezes realista.  Basta ver quantos de nós adulamos figuras públicas na esperança que estas venham a resolver nossos problemas.  Esperamos que estas figuras sejam como o Clark Kent, um sujeito até certo ponto tedioso e ordinário, e se revelem super-heróis para colocar todos os criminosos na cadeia.

Lembro de um momento na história brasileira que boa parte da população foi tomada por uma euforia incomum.  Naquele instante, a população passou a acreditar que todos os problemas de corrupção, miséria, criminalidade, etc, seriam resolvidas por um homem que era visto como íntegro, honesto e determinado a corrigir todos os desvios da nação.  Era um super-herói brasileiro que estava surgindo.  O ano era 2002 e o homem era Lula.  Quantos não foram as ruas comemorar a eleição de Lula?  Poucos realmente se interessaram em saber quais eram os planos do presidente eleito para tirar o Brasil do sufoco.  Na época, estava preocupado se Lula não iria colocar em prática suas mais tresloucadas propostas apresentadas nas eleições perdidas de 1989, 1994 e 1998.  Estas certamente arruinariam o país em tempo recorde, mas nada que mais de 13 anos de irresponsabilidade fiscal e corrupção desenfreada não resolvessem.  Hoje, vários dos que comemoraram a eleição de Lula comemorarão uma eventual prisão deste.  Lula foi de herói para vilão para muitos, haja visto sua alta rejeição em pesquisas de opinião, mas continua sendo adorado por alguns de maneira irracional.

O julgamento do Mensalão iniciado em 2012 revelou outro potencial herói para a população brasileira: o ministro do STF Joaquim Barbosa.  Surgiu até mesmo como um nome para presidente em pesquisas de opinião.  Felizmente, essa ideia não foi para frente devida à veia meio autoritária do ex-ministro.  Ninguém se preocupou com a teoria do domínio do fato, mas sim se os políticos julgados seriam condenados.  Inocência ou culpa era uma questão secundária.  Como ousar questionar o julgamento de um herói como Barbosa?  Bastava que Barbosa decidisse para que houvesse apoio incondicional a esta decisão.  Felizmente, o julgamento decorreu de maneira que vários corruptos e o facínora do José Dirceu fossem condenados.

O mesmo acontece agora na Operação Lava-Jato.  Sérgio Moro foi alçado a uma condição de super-herói e de salvador da pátria.  Claro que há questionamentos sobre se as prisões preventivas têm sido excessivas ou usadas como uma maneira de extorquir confissões.  Aliás, este tipo de artimanha não é exclusiva do Ministério Público brasileiro, até mesmo as promotorias dos Estados Unidos forçam acordos goela abaixo de acusados.  Mas aqui, estamos se aproximando de um ponto que basta a Polícia Federal, Ministério Público ou o Sérgio Moro suspeitar da culpa de alguém para este dever estar trancafiado sem sequer poder exigir qualquer direito constitucional.  Ainda não vivemos algo parecido com o Reino do Terror da França pós-revolucionária de 1793, mas me incomoda a ausência de questionamento jurídico de boa parte da população quanto às ações da Operação Lava-Jato.  Claro que há críticos, entre eles Reinaldo Azevedo e seu histrionismo.  Nota-se que o vazamento da conversa de Azevedo com Andrea Neves dá a nítida impressão de retaliação do Ministério Público contra Azevedo.  O Brasil se encontra em um ponto perigoso em sua história.

O episódio que envolveu a gravação de Michel Temer com o mega-criminoso e dublê de empresário Joesley Batista é escandaloso.  É claro que Temer foi pego em uma situação para lá de constrangedora, mas a maneira que foi pego é preocupante.  Uma gravação ilegal, não peritada e de qualidade para lá de duvidosa foi usada para se lançar o país para uma tempestade.  Porém, o atual repúdio ao acordo de delação com Joesley e agregados mostra que há claramente um limite que o Ministério Público ultrapassou.  Se o pescoço de Joesley fosse "oferecido à guilhotina" junto com os de Temer e Aécio Neves, esse tipo de ação ilegal seria amplamente comemorado.  O fato do Ministério Público brasileiro não ter que responder a ninguém além do próprio Ministério Público preocupa, uma vez que este tipo de ação não é repreendida sob temor da opinião pública considerar qualquer repreensão como uma retaliação por parte de políticos corruptos.

O sucesso da Operação Lava-Jato é necessário por vários motivos, entre eles extirpar sistemas viciados da coisa pública, mostrar punições exemplares a corruptos e corruptores e também resgatar a esperança brasileira em que o país ainda tem chance de dar certo, sabe-se lá quando!  Esses motivos me lembram aqueles mostrados na população que adorava os super-heróis.  A derrota de Lex Luthor para o Super-Homem sempre era um alento à população castigada.  Não interessava se o Super-Homem (ou qualquer outro super-herói) transgredisse as leis desde que o resultado fosse a derrota do vilão.  A retidão moral e ética de Clark Kent era quase um passe livre para suas ações.  Qualquer policial, promotor e juiz que se julgar acima da lei para agir de qualquer maneira para atingir fins específicos está violando o estado democrático.  Se isto ocorre repetidamente, então cria-se um estado de exceção e com apoio popular.

Não devemos esquecer que apesar de cidadão de destaque, ainda positivo, os protagonistas da Operação Lava-Jato não devem receber um cheque em branco da sociedade para fazer o que bem entendem para atingir os resultados.  Estes são sim subordinados às leis descritas na Constituição Brasileira, por mais que esta seja problemática.  E também devemos lembrar que os vilões nossos, Joesley Batista e até mesmo Lula, estão aí por nossa responsabilidade.  Como gosto de lembrar, mesmo diante de um apoio maciço da população ao julgamento dos mensaleiros, Lula foi re-eleito em 2006 por essa mesma população, cúmplice da corrupção amplificada pelo PT e dos conchavos do governo lulopetista com criminosos da laia de Joesley Batista.  O Brasil atravessará uma sequência de crises enquanto nos portarmos como os pusilânimes humanos das estórias do Super-Homem.

sábado, 15 de abril de 2017

O Ataque das Formigas Reforçadas

A Guerra Fria e a constante ameaça de um holocausto nuclear foi algo que não só marcou a minha geração, e outras anteriores, como também inspirou a criação de algumas peças de ficção memoráveis, a exemplo de bons filmes como The Day After, Testament Threads, além dos dois últimos filmes da trilogia original de Mad Max, que mostravam os devastadores efeitos que esse tipo de conflito poderia ter sobre a humanidade.  Já outras peças de ficção apesar de não terem esta qualidade eram igualmente marcantes pela imaginação fértil do que poderia acontecer, como foi o filme de 1977 Damnation Alley.  Nessa pérola do cinema trash apocalíptico, os sobreviventes do ataque nuclear entre os vários perigos que se deparavam, tinham que enfrentar enxames de baratas indestrutíveis que rapidamente dizimavam os atores coadjuvantes, desesperados para colocarem em seus pífios currículos ao menos 5 minutos de participação em qualquer filme meia-boca .  Essa foi a época que se acreditava que, em um pós-guerra nuclear, o planeta Terra seria dominado pelos insetos como baratas e formigas.  Na década de 1990, o impagável Pinky and the Brain dedicou um episódio no qual o Pinky e o Cérebro viajavam para um futuro dominado pela civilização das baratas que ascenderam à posição de espécie dominante na Terra após os EUA, governado literalmente pela cabeça de Bill Clinton conservada em uma jarra, entram em guerra com o Canadá causando o holocausto nuclear.  Também nesta década, surgiu a franquia de RPG para computador Fallout, aonde o protagonista após anos em um abrigo nuclear saía para a superfície e tinha que batalhar com várias criaturas resultantes da radiação como formigas gigantes.

A divulgação da lista de Edson Fachin está sendo comparada à explosão de uma mega bomba atômica no Brasil.  O conteúdo das delações de Emílio e Marcelo Odebrecht são realmente estarrecedoras.    A política é um meio sujo, isso já era conhecido há muito tempo, conforme já dizia o chanceler alemão Otto von Bismarck, em uma frase atribuída a este, os cidadãos não poderiam dormir se soubessem como são feitas as leis e as salsichas.  Mas o que choca é que existe um sistema em vigor a serviço da corrupção no Brasil.  É a famosa cleptocracia, no qual só os bandidos ascendem ao poder.  A Odebrecht financiava todos os partidos de expressão, os da situação ganhavam mais sob forma de propinas e similares, mas os de oposição também recebiam.  Esses últimos eram compostos por políticos que não recebiam propinas por não estarem em posição de recebe-las, mas tinham todo o potencial de quando no governo cometerem os mesmos desmandos em troca de propinas.  A esquerda brasileira cria a narrativa que os políticos são corrompidos graças aos empresários inescrupulosos, uma variante das teorias de Jean-Jacques Rousseau.  Mas também pode ser elaborada a narrativa que os políticos só permitem a existência de empresas corruptas, já que as idôneas não sobreviveriam sem molhar as mãos dos burocratas.  É inútil nesta hora discutir o que veio antes, se o ovo ou a galinha.  É necessário repensar a democracia brasileira, e aí mora o perigo, pois no momento ela está sendo repensada por políticos corruptos.

Em meio às atordoantes notícias recentes, dois pontos são relevados a segundo plano diante do alarde, quando não deveriam ser.  Primeiro, essa lista não é uma bomba atômica e sim uma poderosa arma convencional como a tal da MOAB (Mother of All Bombs) lançadas no Afeganistão pelos americanos para destruir membros do Estado Islâmico.  Os políticos atingidos pelas delações estão ainda em posição de poder.  A lista contém nomes de políticos que estão sendo investigados, que sequer foram denunciados quanto mais condenados.  Basta ver a morosidade das investigações e da justiça brasileira para se traçar uma linha de tendência que aponta que talvez em 2030 se conclua todas essas investigações.  O segundo ponto é que não se dá crédito à ímpar resiliência do político corrupto brasileiro.  Há quanto tempo Renan Calheiros está no cenário político em posição de eminência apesar de quase todos, menos seus eleitores, saberem o tipo de político que ele é?  Enquanto não forem afastados, ou por cassação ou pelo voto, essas pragas estarão tramando maneiras de continuarem no poder.  O famigerado projeto de voto em lista fechada é uma maneira de Renan e similares de escaparem os efeitos da explosão da MOAB tupiniquim.

Mas não há dúvida, a lista de Fachin surtirá efeitos drásticos no cenário político.  Neste momento, o maior estrago foi feito na oposição ao PT.  Pelo menos enquanto Lula não for preso.  O PSDB neste momento é o partido mais duramente atingido por estas delações.  O partido que durante os governos do PT  se tornou o mais forte de oposição, por exclusão e não exatamente por opção espontânea, tem seus principais líderes atingidos.  Mesmo que o PSDB não tenha participado do assalto à Petrobras, que é o foco da Lava-Jato, só o fato de Aécio Neves, José Serra, Geraldo Alckmin e outros tucanos graúdos serem citados pelos Odebrecht já causa um dano irreversível em qualquer pretensão destes à presidência da república.  Se estes realmente agiram de maneira criminosa, que sejam punidos após investigações diligentes.  Mas o fato de estarem na lista já demonstra que o PSDB flertava com uma instituição podre em seu âmago.  O DEM também foi atingido, mas lembrando que este era o antigo PFL e que era por sua vez uma dissidência do PDS, isso não deveria espantar ninguém que é atento à política.

Os danos infligidos aos dois partidos que mais fizeram oposição ao PT durante seu governo faz surgir um vácuo entre possíveis presidenciáveis para 2018.  A esquerda até certo ponto se satisfaz com esta devastação, pois como já foi dito por alguns cronistas, o PT almejou igualar diante da opinião pública todos os partidos na corrupção assim que as investigações da Lava-Jato chegaram à imprensa.  Caso Lula não seja preso e impossibilitado de concorrer, esse é um candidato forte para o posto, para o desespero da nação.  Marina e Ciro Gomes são outros nomes para 2018 e apesar de ser improvável a eleição de qualquer um dos dois, a possibilidade destes conseguirem atrair eleitores de oposição para si e se classificarem para um segundo turno é preocupante.  O pior cenário seria aquele no qual Lula enfrenta Marina ou Ciro no segundo turno.  Outros candidatos de esquerda como oriundos do PSOL, PCdoB e outros partidos similares não assustam pois não terão suporte financeiro ou estratégico para alcançar a maioria dos eleitores.

Aquilo que é chamado pelos esquerdistas como "direita", que na verdade são demais políticos e partidos que não compartilham da ideologia que colocou o Brasil na crise, tem de apresentar candidatos fortes para 2018.  Em 2014, Aécio Neves deu um rosto à oposição e quase conseguiu derrotar Dilma.  Depois foi alvo de sistemáticos e implacáveis ataques do PT que foram bem eficazes em minar sua popularidade.  Os últimos eventos sepultaram sua chance em 2018, apesar que podem não ter sepultado sua candidatura propriamente dita.  Caso o PSDB queira realmente ter chance em 2018, o nome do seu candidato, no momento pelo menos, é João Dória.  Por mais que negue e diga que não é candidato, pelo andar da carruagem, Dória será forçado a concorrer a presidência.  Vem fazendo uma boa administração na prefeitura de São Paulo, apesar de ser cedo ainda para uma avaliação mais concreta.  Indago se seu estilo vai ter eficiência similar na presidência.

Como a lista de Fachin não é uma bomba atômica, não seremos atacados por formigas gigantes ou similares, mas sim pelo que eu chamo de formigas reforçadas, isto é seres de segundo escalão que não teriam destaque em condições normais, mas que neste cenário de devastação ganham eminência de maneira igualmente preocupante.  Jair Bolsonaro é um que em outras épocas não teria chance, e nem agora tem muita, mas pode tirar votos de candidatos melhores.  Sua plataforma parece se resumir a soluções simplistas para reduzir a criminalidade, algumas até soam como corretas, e populistas para a economia.  Não tenham dúvida que uma improvável eleição sua traria um retrocesso na economia, pois vejo em Bolsonaro as mesmas ideias equivocadas implementadas no final da ditadura militar como maior intervenção do estado, como se isso fosse possível, e uma possível estatização de alguns setores da economia.  Em suma, esperem aumento de despesas do governo no longo prazo sem preocupação em se aumentar receitas, sem contar mais focos de corrupção.

O pior é que outros aventureiros podem surgir ainda antes de 2018.  Difícil vislumbrar se irão ter chance de ganhar, mas não consigo ver ninguém fazendo uma campanha baseada em redução do tamanho do estado, reformas tributária, trabalhista e previdenciária, pois não tem apelo popular esta plataforma.  Basta lembrar da eleição de 1989 e ver as propostas absurdas dos principais candidatos, especialmente os de esquerda.  A tempestade perfeita é a ascensão dessas formigas em um cenário de crise econômica como esta no qual o Brasil atravessa.

Não há dúvidas que a Lava-Jato deve prosseguir.  Sua interrupção seria um incentivo aos corruptos continuarem a devastar o Brasil.  Não se deve esquecer que a crise atual é fruto dos esquemas corruptos do PT e não da Lava-Jato em si.  E que a oposição ao PT também deve ser investigada e condenada, se provada a culpa, para que se elimine futuros corruptos e que novos Petrolões e Mensalões não aconteçam.  Basta lembrar que antes de 2002, o PT tentava convencer a todos que era o mais idôneo dos partidos.  Entretanto, uma dose de pragmatismo é suficiente para se notar que o futuro que se desenha para o Brasil é sinistro.






segunda-feira, 20 de março de 2017

A Eterna Infância Brasileira

Em 1953, foi publicado o livro O Fim da Infância do autor britânico Arthur C. Clarke que narra a estória da chegada de alienígenas ao nosso planeta e as consequências finais terríveis decorrentes deste contato.   Os alienígenas, conhecido como os Overlords, aparecem no ápice da Guerra Fria com a humanidade se preparando para se destruir por completo, sim estivemos bem perto disso, e impedem esta destruição.  A Terra passa a ser tutelada pelos visitantes que inicialmente oferecem várias vantagens como o fim do apartheid, das touradas e um período de paz ímpar na história da humanidade.  O livro termina com a raça humana deixando de existir após décadas de jugo alienígena quando os Overlords transformam a última geração de crianças em seres telepatas desprovidos de humanidade que vão se juntar ao Overmind, uma consciência única formada de civilizações extintas na galáxia a quem os Overlords serviam.  Os últimos capítulos do livro são simplesmente tétricos e melancólicos.

Algumas interpretações podem ser feitas sobre esta obra de um dos principais autores de ficção científica da história, mas a minha é que há um preço alto a se pagar quando somos tutelados em consequência de não sabermos tomar as decisões necessárias para gerir nossas vidas.  No caso da Guerra Fria, esta “esfriou” em 1991 quando a União Soviética se desmantelou resultado de anos de devastação socialista na economia do Segundo Mundo.  Atualmente, quando vejo Trump e Putin no poder, indago se os Overlords estariam próximos a se revelarem a nós.

Mas a incapacidade de auto-gerência não é só aplicável à paz mundial e sim a de se manter uma sociedade economicamente estável.  A infinita e extraterrestre incompetência do governo Dilma em gerir o país e a conivência de boa parte da população brasileira em eleger e reeleger Dilma devastou a economia do país.  O resultado é um déficit público assustador capaz de arruinar as futuras gerações brasileiras e a única maneira de sair desta situação é o Brasil como um todo se unir e aceitar os sacrifícios necessários que devem ser feitos.  A Reforma da Previdência proposta é o mais importante destes sacrifícios que devem ser feitos, caso isto não seja feito este déficit não será revertido.  Infelizmente, não há a consciência de boa parte da população brasileira da gravidade da situação e das consequências da manutenção das atuais regras da previdência.

Debates resultantes deste tema giram em torno da “supressão de direitos” do povo, como se a atual crise não suprimisse estes mesmos direitos, e até mesmo a teses de contabilidade criativa tentando nos convencer que a crise previdenciária não existe.  Castas do funcionalismo público brasileiro de número reduzido, mas com muito poder de se fazerem ouvidas, estão preocupadas com o fim de seus privilégios e não se importam que o resto da população tenha que arcar com os custos destes privilégios.  Enquanto isto, boa parte dos trabalhadores são obrigados a contribuir ao INSS e não só com o que é descontado do salário bruto, mas também com outros encargos impostos ao empregador e que são esquecidos na conta final.  Ao se aposentarem receberão menos do que contribuírem.

Faço então a pergunta que o Brasil como um todo deveria estar fazendo: por que precisamos do governo gerindo a nossa previdência?  O INSS deveria existir?  Quando olho para meu holerite e vejo o quanto o governo confisca do meu salário sob o eufemismo de contribuição, lembro que eu poderia gerir melhor este dinheiro do que o governo.  O principal motivo para isto é que tenho interesse em fazer este dinheiro render muito mais do que qualquer governante ou burocrata terá.  Alguém poderia dizer que a minha contribuição é necessária para aqueles mais desfavorecidos se aposentarem.  E mais uma vez o país segue atolado em políticas assistencialistas que não reduzem e sim perpetuam a pobreza.  Se aplicasse em um fundo de renda fixa ou caderneta de poupança, poderia obter uma melhor renda no futuro do que tendo o dinheiro “confiscado”.  É mais do que conhecido que o regime previdenciário brasileiro deveria ser de capitalização e não de contribuição, isto é a aposentadoria é fruto do quanto se poupou e não de um confisco da produção das gerações mais novas.  Quem quiser aposentar no “ápice da velhice” aos 45 anos que faça isso ganhando dinheiro suficiente para se sustentar pelo resto de sua vida e não metendo a mão no bolso alheio.

Qualquer estudo demográfico mais simplório é capaz de escancarar que a situação piorará e muito se as regras da previdência não forem alteradas.  O envelhecimento da população brasileira e mundial é um fato consumado e a passividade diante disto resultará em um desastre anunciado.  Portanto, estas gerações mais novas que sofrem confiscos terão seus direitos de saúde, segurança e educação subtraídos para que se mantenham privilégios de uma geração anterior.  O argumento que é necessário trabalhar 49 anos para conseguir uma aposentadoria integral é em seu âmago risível.  Quer dizer que alguém que trabalhe 49 anos não foi capaz de gerir o seu sustento para que pudesse ter recursos próprios para se sustentar?  Recomendo àqueles que reclamam disto conversarem com seus respectivos gerentes de banco para contribuírem (voluntariamente) com um plano de previdência privado.  São investimentos ruins, mas que podem dar um retorno digno e merecido no futuro, em um tempo mais curto que 49 anos.


O que me choca nesta celeuma absurda toda é que o brasileiro exige cada vez mais uma tutela maior do estado sobre nossa vida, e uma tutela nociva.  Tirando um punhado de liberais que sabem somar e subtrair, além daqueles que pertencem às castas privilegiadas que usam os conhecimentos de aritmética em benefício próprio, o que me parece é que o resto da população dá uma declaração de incompetência de gerir as próprias finanças.  Se não souberem vão ter que aprender de alguma maneira, ou irão arcar com os resultados desta incompetência.  Ignorância disseminada não pode ser desculpa para se arruinar o país como um todo.  Enquanto não tivermos controle sobre nossas decisões e pedirmos tutela de outros, os Overlords que habitam Brasília, que como já disse é um mundo existente em outra dimensão, continuarão trabalhando para ceifar em um futuro muito próximo as nossas futuras gerações.  O Brasil precisa virar adulto.