domingo, 15 de novembro de 2015

A Fortuna de um Saco de Batatas



Uma vez no escritório onde trabalhava, foi organizado um bolão para apostar na Mega-Sena que tinha o prêmio acumulado.  Nossa chefe ficou sabendo do bolão e pediu para também participar, alegou que se fosse bem sucedida a aposta, ela não queria ir trabalhar sozinha no departamento na semana seguinte.  Todos nós já devemos ter ouvido piadas, estórias ou delírios de colegas, amigos e familiares do que fazer se ganhássemos vários milhões de reais, passando por mansões, carros, viagens e até investimentos de longo prazo.  Mas não conheço ninguém que tenha falado que pretendia fazer um curso de especialização para investir na carreira, se dedicar mais ao trabalho, apesar de existirem, aliás a grande maioria gostaria no primeiro ato pedir demissão.  Alguns até pensam em abrir um negócio próprio para se ocuparem, mas uma boa parte pensa em relaxar e aproveitar.  Obviamente que não foi bem sucedida a aposta e todos os participantes foram trabalhar, minha ex-chefe inclusive.  Mas fico imaginando a cena insólita de uma segunda-feira no qual chegaria para trabalhar com o departamento vazio.  Para empresa seria um completo desastre e, dependendo da quantidade de ganhadores, até significaria uma inevitável falência.

Na obra-prima de Scott Adams, O Princípio Dilbert, o último capítulo é dedicado ao sistema concebido por Adams de OA5, em inglês Out at 5, ou seja no qual ele defendia que os funcionários saíssem às 17:00, pois longas horas de trabalho implicariam mais funcionários desmotivados e descontentes no trabalho.  Exageros à parte, afinal todo o universo do Dilbert era engraçado por ser justamente exagerado, Adams tem um ponto válido.  Nem todos nós temos motivações ou condições de nos tornarmos milionários, condição que para se chegar demanda na esmagadora maioria das vezes esforço, dedicação, diligência e sacrifício.  A motivação para se gastar horas do dia, e da vida, longe de casa, aturando algumas vezes superiores intragáveis é que receberemos um salário não-milionário, apesar do esforço, dedicação, diligência e sacrifício, para podermos sobreviver e até guardar algo para o futuro.  Tire a necessidade desta pessoa dispender este tempo para sobreviver e guardar algo para o futuro, e esta pessoa não terá mais essa motivação para trabalhar.  Claro, alguns realmente gostam do que fazem, não sabem o que podem fazer com o tempo livre, possuem um senso de civismo diferenciado e, portanto, trabalham por motivações diferentes.  Não devemos julgar nem aqueles que sonham em se aposentarem com o prêmio da loteria e nem aqueles que apesar de não admitirem não iriam mudar a rotina.  Mas as motivações mudariam na situação de se ganhar um prêmio polpudo.

Desde que me conheço como brasileiro, sempre ouvi que se achássemos petróleo ou outros minerais preciosos, como o nióbio (!), seríamos ricos.  Lula no auge do seu populismo bradou que tínhamos achado um bilhete de loteria premiado com pré-sal.  Sempre tive dúvida se realmente achamos este bilhete premiado, apesar da certeza que muitos do governo lulopetista acharam uma verdadeira mina na Petrobras para rapinar e pilhar durantes estes 13 anos.  Mas partindo do pressuposto que realmente ganhamos um bilhete de loteria naquela época, o que faríamos com este dinheiro?  Sempre ouvi que se achando petróleo, o povo brasileiro seria rico e membro da OPEP.  Isso significaria que todos seríamos milionários e poderíamos em tese parar de trabalhar e nos aposentar?  Que poderíamos ter um padrão de vida igual ao de países do primeiro mundo sem ter os mesmos índices de produtividade, nível de educação e consciência cívica?  Os tais dos royalties do petróleo do pré-sal foram alvo de acalorado debate no congresso brasileiro.  Mesmo sem sabermos se era economicamente viável explorar ou não esse petróleo, vários queriam participação nessa possível renda.  Estados milhares de quilômetros distantes do litoral fluminense pleiteavam parte do prêmio do suposto bilhete premiado, enquanto o governo fluminense tentava enxotar essa turma alegando que sem esse dinheiro não haveria as Olimpíadas de 2016.  Argumentos a favor e contra a distribuição dos royalties proliferam, mas pelo menos para mim ficou claro algo, se é que já não estava antes, nós os brasileiros, não só a classe política, preferimos discutir a distribuição da riqueza alheia a discutir o que realmente é necessário fazer para o país entrar nos trilhos.  Não lembro de ter visto esse tipo de empenho para se realizar reformas previdenciária, trabalhista e tributária.

É mais do que sabido que países como Japão, Finlândia, Holanda, entre alguns outros, são ricos sem terem ganho bilhetes premiados da loteria.  Alguns países membros da OPEP são também ricos, mas seus índices culturais, educacionais e até mesmo sociais são medíocres.  Basta olhar a Venezuela para se ver que petróleo não se traduz em riquezas e nem em mais justiça social.  Na verdade, enquanto um povo se ater aos princípios mercantilistas da Idade Média e Moderna, esse povo estará condenado à mediocridade.  Somente uma sociedade empenhada em gerar riquezas pelo trabalho, e enfatizo pelo trabalho qualificado, conseguirá ser próspera.  Não precisamos de uma sociedade composta por workaholics, mas sim por pessoas que acreditam que não há caminho fácil para o sucesso.  Apesar de uma esmagadora maioria desejar ser premiada na loteria, não podemos ficar sentado esperando isso acontecer.  Se o Brasil não achar petróleo, ou até nióbio, suficiente em seu território, isso não quer dizer que seremos condenados à pobreza crônica.

Lembro do clipe da música Rubão da banda Charlie Brown Jr no qual é mostrado um pobretão achando uma carteira recheada de dólares e ao invés de se investir em seu futuro, o sujeito resolve torrar em festas, carros e mulheres.  Nunca consegui descobrir se a banda quis fazer uma apologia à “virtude da pobreza”, ou ridicularizar aqueles que acham que por descobrirem um punhado de dinheiro irão ser eternamente milionários.  Mas existem muitos que sonham em ganhar uma “grana fácil” para não fazer nada, é só pesquisar e ver quantos parentes de artistas e esportistas bem sucedidos se penduram nestes.  Apesar que há alguns artistas que quando se tornaram famosos resolveram colocar todos os seus familiares para trabalhar em seus negócios, e estes foram o que mais prosperaram.  Na minha experiência de vida, dinheiro que é ganho fácil nunca tem seu valor reconhecido, e quanto menos alguns não trabalham, mais eles exigirão daqueles que trabalham.  No dia em que ficarmos todos milionários por termos achado bilhetes premiados de loteria, petróleo abundante no país ou até por termos todos parentes ricos, seremos todos miseráveis, pois ninguém vai querer trabalhar.  Se todo mundo relaxar e resolver não trabalhar mais, quem irá  produzir alimentos, vestimentas, energia, etc?  Daí vai acontecer que nem um antigo colega de trabalho meu profetizava, quem tiver um saco de batata vai ser o realmente milionário.