sexta-feira, 7 de outubro de 2016

O Dilema da Daslu

Uma vez, me convidaram mais a minha esposa para fazermos compra na Vila Daslu, aquele shopping onde se comercializava produtos para as classes mais abastadas.  A minha resposta seria que eu iria de tênis velho, calça de camuflagem e camiseta do Che Guevara.  O meu sarcasmo não foi bem apreciado, porém, não deveria ter respondido daquela maneira.  O convite por si próprio era absurdo, pois jamais fomos propensos a gastar uma significativa parcela do salário em vestuário de ostentação.  Deboche à parte, vestir qualquer roupa que homenageie um genocida é um profundo desrespeito com as vítimas da sanha assassina de um falso herói cultuado por ignorantes de sua verdadeira história. 

Não ficaria surpreso se visse um ex-frequentador da Daslu vestindo uma camiseta do Che Guevara, até mesmo se fizesse isso dentro da própria Daslu ou atualmente em algum local frequentado pela mais alta classe da sociedade.  É a famosa Esquerda Caviar, debatida extensivamente por vários, que gosta de ostentar, mas diz se preocupar com os mais pobres.  Esse posicionamento sempre me deixou perplexo, ou deriva de culpa ou de inveja daqueles que têm ainda mais dinheiro, afinal a inveja não é um sentimento exclusivo aos mais pobres.  Os membros da Esquerda Caviar que gostam de vestir bonés e camisetas com o rosto do Che Guevara, invariavelmente se esbalda com roupas caras, carros de luxo e festas nababescas.  E ainda por cima, em mais um sinal de estranheza, gostam de ter um reconhecimento alheio pela riqueza que acumulam.

O monumento à ostentação que foi a Vila Daslu na Vila Olímpia realmente chocava, apelando tanto para a cobiça como para a inveja de quem não a frequentava.  Para mim era algo desnecessário, sendo que lojas nos Jardins Paulistano e no Shopping Iguatemi eram os verdadeiros rivais da Daslu de Eliana Tranchesi e atraíam sua clientela sem a ostentação escancarada concebida por Tranchesi.  Em uma cidade com um alarmante índice de criminalidade, a pior coisa é pintar um alvo nas costas sinalizando que tem dinheiro de sobra.

Claro que surgiram as críticas lá em 2005, quando a marca Daslu ergueu seu elefante branco à beira da Marginal Pinheiros.  Os "politicamente corretos (chatos)" alegavam que aquele elefante branco era uma afronta a todos os desfavorecidos.  Ou usaram este termo ou outro politicamente correto (imbecil) para criticar que os mais pobres, e até alguns menos ricos, não poderiam comprar calças jeans de mais de 5 mil reais.  Desdenhar da Daslu e de quem frequentava a Daslu era até divertido, mas ficava a curiosidade de como seria lá dentro e até como seria usar um dos produtos lá comercializados.

Muito pode ser dito a respeito de como o dinheiro afeta a vida das pessoas.  Existe o tal estudo, mal-interpretado por alguns, do economista Angus Deaton e do psicólogo Daniel Kahneman que afirmam que para salários acima de US$75.000,00 anuais, o dinheiro não aumenta a satisfação pessoal.  Independente do que estes pesquisadores quiseram inferir, dinheiro resolve uma miríade de problemas que a falta de dinheiro causa.  É da natureza do ser humano ambicionar o que os outros têm, como já diria a letra da música Sit Down do grupo inglês James "If I hadn't seen such riches / I could live with being poor".

Duas atitudes podem decorrer destas ambições, a primeira é aquela mais mesquinha propagada pela ala mais estúpida da esquerda mundial que é a de desdenhar da riqueza alheia e de como ela foi obtida, acusar os ricos de crimes por serem ricos e de toda sorte de males que afligem a humanidade.  Essas atitudes justificam a criminalidade sempre com o intuito corrigir injustiças sociais, seja lá o que isso realmente quer dizer, se apoderando da riqueza alheia.  Essa ala local da esquerda usa essa retórica para poder se eleger e de Brasília assaltar a riqueza alheia em larga escala.

A segunda atitude, mais construtiva, é a de a pessoa criar incentivos para si próprio para atingir este patamar de preferência pelo trabalho honesto.  Às vezes, esse tipo de ambição, é claro, resulta em trabalhos menos do que honestos.  Nações ricas e prósperas são motivadas pela vontade de seu povo de atingir patamares econômicos superiores aos atuais.  O declínio destas nações decorre de situações onde há acomodação ou, pior, usurpação da riqueza alheia, muitas vezes camufladas de impostos crescentes sobre os mais ricos e até de programas sociais de distribuição de riquezas.

O exemplo clássico é dado pelas nações alemã e japonesa que foram arrasadas após a derrota da II Guerra Mundial em 1945 e se reconstruíram.  Os asiáticos ainda sofreram os singulares ataques nucleares dos americanos e revidaram obrigando décadas depois o povo dos EUA a comprarem televisores da Samsung e a dirigirem carros da Toyota.

É claro, que há um terceiro grupo, bastante numeroso, que são aqueles que são indiferentes à opulência alheia.  Talvez esses sejam acometidos de um pouco de inveja ou vontade de exibir riquezas que não tem, mas esse sentimento não é dominante nestas pessoas.  Os que são completamente indiferentes são casos à parte, possivelmente são mais ricos que os antigos frequentadores da Daslu, sustentados pelo dinheiro alheio ou quem sabe são pessoas mais evoluídas espiritualmente.

Daquela época da Daslu se impondo na Marginal Pinheiros, lembro de um punhado de gente rica que não perdia a chance de ser desagradável ao exibir ostensivamente o que tinham para o resto da cidade, e mais ainda de um bando de gente chata e desocupada que ao invés de se preocuparem com seu trabalho ou as contas para pagar resolviam desdenhar da riqueza alheia.  No fim, veio a Operação Narciso em 2010, e a Daslu abandonou o elefante branco para voltar a ter a discrição necessária.