terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Um Longo Caminho pela Frente



No dia 22 de novembro de 2015 os argentinos foram às urnas e elegeram o liberal Mauricio Macri como seu presidente.  Para os demais latinos americanos, em específico os brasileiros, cansados do populismo da turma do Foro de São Paulo e dos demais bolivarianos e socialistas que infestam essas bandas, a eleição de Macri foi motivo de comemoração e um alento de esperança.  É um marco que significa a derrocada do bolivarianismo e, portanto, a recolocação dos países acometidos de populistas de esquerda em um caminho virtuoso.  Muita calma nesta hora, pois o caminho que a Argentina terá de percorrer é longo e traiçoeiro.

Há 100 anos atrás, a Argentina era uma nação com renda per capita superior a de países como Itália, Dinamarca, Japão, Espanha, ocupando a notável 7ª posição neste ranking.  Mas nenhuma economia sólida é capaz de resistir a políticas populistas que no longo prazo corroem quaisquer conquistas.  Uma crescente participação do governo na economia com estatizações de setores industriais lentamente empurraram a Argentina para a medíocre 53ª posição em renda per capita.  Continuam na frente do Brasil, mas para um país que tinha esse valor 400% maior que o nosso, uma vantagem de quase 50% mostra que as coisas degringolaram muito ao sul do Rio da Prata.  Uma análise completa da decadência argentina resultaria em várias teses de doutorado extensas, passando pelos inúmeros equívocos das lideranças argentinas.  Mas o que chama atenção é que Macri é o primeiro liberal eleito lá em mais de 100 anos, mesmo que em alguns destes anos o governo tenha passado por atrozes e nocivas ditaduras militares.  Os demais eleitos foram todos populistas do naipe de Cristina Kirchner.

A conclusão que se chega é que apesar da escassez de lideranças políticas responsáveis por lá, o povo argentino abraçou o populismo barato até agora como um paradigma de boa governança.  A situação do país é crítica, a economia está emperrada, a inflação está em quase 25% ao ano pelas estimativas não-oficiais, o crédito do país está arruinado desde a moratória forçada de 2001, e para piorar a imagem junto aos investidores veio a estatização da YPF realizada em 2012, a imprensa livre foi minada por Cristina Kirchner, a justiça foi aparelhada e infiltrada por populistas, o país sofre com desabastecimento de produtos industrializados devido a inúmeras barreiras comerciais, sendo que algumas delas existem graças a uma conivência inaceitável do governo brasileiro.  O desafio de Macri é recuperar o país diante de um cenário muito difícil.  Sem crédito na praça e com uma gastança desenfreada, a Argentina precisa de recursos para crescer e mostrar que é merecedora da confiança de investidores.  A iniciativa de Macri de querer acionar a cláusula democrática contra a Venezuela no Mercosul é não só louvável como um acertado primeiro passo.

O mundo precisa perceber que o liberalismo veio para ficar na Argentina e o primeiro passo é demonstrar que o país não quer se associar com uma nação como a Venezuela que notoriamente cerca os direitos individuais mais básicos e é uma protoditadura.  Os demais passos são mais complicados.  A negociação com fundos abutres que em 2014 conseguiram na justiça americana a exigência que os títulos argentinos sejam pagos em sua totalidade é um desafio maior que a postura adotada perante a Venezuela.  Isso sem contar que qualquer país que queira migrar do socialismo ou do populismo barato para uma economia liberal precisa lidar com uma inevitável parcela da população acostumada a receber privilégios sem uma contrapartida.  Reformas liberais demoram para surtir efeitos, ainda mais em países devastados economicamente, mas afetam rapidamente aqueles acostumados a ganhar sem produzir.

No curto prazo, decisões populistas são bem sucedidas e tentadoras, mesmo que o posterior desastre seja certeiro.  Quando 48% da população vota em Daniel Scioli, candidato do kirchnerismo / peronismo / bolivarianismo, isso é uma demonstração que boa parte da população não estará muito propensa a aceitar medidas de saneamento da economia necessárias como privatização de estatais, redução de privilégios trabalhistas, corte em programas assistencialistas, etc.  O maior desafio de um país em crise não é tomar decisões amargas, é convencer a toda população que todos sem exceção terão de amargar essas decisões.  Arrisco ainda a dizer que entre os eleitores de Macri estão vários desiludidos com o kirchnerismo, mas não com o populismo.  Isso quer dizer que surgindo outro candidato populista, descolado de Cristina Kirchner, pode vir a bater de frente com Macri e reverter qualquer avanço conquistado.

Toda esta análise sobre a Argentina pode ser aplicada ao Brasil feitas algumas modificações devido a percursos históricos diferentes entre os dois países.  Mais do que nunca temos de estar atentos aos nossos vizinhos.  As dificuldades de Macri podem ser as mesmas enfrentadas por qualquer político que venha a substituir Dilma e sua agenda populista e incompetente.  A principal oposição ao PT é ainda o PSDB com sua agenda “encima do muro” e com algumas lideranças desgastadas.  Um maior desgaste a ser infligido aos tucanos aumenta a chance de um aventureiro populista vir a ascender em um cenário de devastação econômica como o enfrentado neste país.

Nunca torci pela seleção argentina, mas torço muito para que o país saia do buraco que se encontra.  É importante que isso ocorra para que o Brasil tenha em quem se espelhar para nos livrarmos das nossas pragas populistas.  Mas para tal os argentinos terão de enfrentar muitos percalços neste caminho longo.  Tomara que consigam.  E tomara que Macri realmente adote uma agenda liberal e não caia em tentação populista.