domingo, 7 de dezembro de 2014

O Ocaso da Fórmula 1



A temporada de Fórmula 1 terminou neste dia 23 de novembro.  Lewis Hamilton ganhou seu segundo título, Felipe Massa disputou a liderança da corrida, Sebastian Vettel fez sua última corrida na Red Bull e Fernando Alosno fez também a sua última na Ferrari.  Mas a notícia mais importante na minha opinião vem do final do grid.  Duas equipes nanicas, Caterham e Marussia, finalmente abriram o bico, a primeira não se sabe se vai continuar em 2015 e a segunda se foi de vez.  Eram equipes inexpressivas e que dificilmente fariam diferença na Fórmula 1.  Mas chamou a atenção para a crise financeira da categoria e a chiadeira de Sauber, Lotus e Force India é preocupante.  Considerando as encarnações anteriores dessas equipes, lembremos que por elas passaram Ayrton Senna, Kimi Raikkonen, Fernando Alonso, Sebastian Vettel, Jenson Button, entre outros.  Michael Schumacher correu pela Sauber no Mundial de Protótipos, pela Force India, quando esta era Jordan, e pela Lotus, quando esta era Benetton.  São equipes históricas e de tradição de revelarem bons pilotos.  Quando essas equipes reclamam desta situação, talvez seja o momento de ver se estas reclamações têm mérito e se são o sinal de algo mais sério.

A Fórmula 1 já foi auto-proclamada o 3º evento esportivo mais importante do mundo, só perdendo para a Copa do Mundo da FIFA e as Olimpíadas de Verão.  Hoje sua audiência está diminuindo a cada ano e envelhecendo.  Mas ao invés de procurar soluções, o supremo Bernie Ecclestone debocha das redes sociais e dos jovens consumidores, alegando que estes não conseguem comprar relógios caros e abrir contas em bancos.  Alguém esqueceu que a atual geração de Twitter e Facebook daqui a 20 anos estará comprando relógios caros e abrindo contas em mais de um banco, mas provavelmente não estará assistindo Fórmula 1 nos domingos, nem no autódromo e nem na TV.  Existe uma grande possibilidade que a Fórmula 1 simplesmente não exista daqui a 20 anos.

Muitas teorias podem ser elaboradas para o ocaso da categoria, mas a realidade está aí para quem quiser ver.  A Fórmula 1, desde o final da década de 1970 quando a categoria se tornou mais lucrativa e bem sucedida, passou a ter uma maior participação das montadoras de automóveis.  Estas haviam debandado da categoria após o horrendo acidente nas 24 Horas de Le Mans de 1955 que matou mais de 80 pessoas.  Os custos da categoria começaram a aumentar geometricamente nas décadas de 80 e 90, sendo que equipes tradicionais como Brabham, Lotus, Ligier e Tyrrell se viram obrigadas a fechar as portas.  Em seus lugares vieram as equipes oficiais das montadoras e em 2008 o campeonato tinha Ferrari, Renault, Honda, Toyota, Mercedes e BMW, estas duas últimas acionistas majoritárias de McLaren e Sauber, respectivamente.  O orçamento anual de uma equipe dessas ultrapassava fácil os US$200 milhões.  A opulência e o desperdício reinaram.  A categoria deixou de ser disputada por equipes independentes, cujos alguns donos até hipotecaram casas para poder manter as equipes vivas, que foram substituídas por equipes controladas por uma montadora, cujos acionistas muitas vezes se mostravam descontentes com os gastos na Fórmula 1.  Veio o estouro da bolha imobiliária em 2008 e as montadoras começaram a debandar.

Nesse meio tempo, surge o fundo CVC para adquirir os direitos comerciais da Fórmula 1 em 2005, o que agravadou a crise posteriormente.  O CVC em sua ganância de maximizar seus lucros neste investimento esportivo deixa apenas algumas “migalhas” para as equipes.  As montadoras, no auge de suas presenças na categoria, já haviam mostrado profunda revolta contra este status quo.  Hoje as montadoras como Toyota e BMW disputam outras categorias de esporte a motor com custos bem menores e no qual estas montadoras podem realmente usar tecnologias úteis ao desenvolvimento de seus veículos de passeio.

O resultado é que os custos da Fórmula 1 continuam em patamares altos, as receitas das equipes são minadas pelo próprio parceiro comercial, e para piorar o espetáculo esportivo muitas vezes fica a desejar.  A chance de em 2016 o grid ser formado por menos de 15 carros não é nada desprezível, muito pelo contrário.  A categoria sempre atraiu equipes que substituíam outras que desistiam da categoria.  A única nova no horizonte é a americana Haas, que seria uma irmã da Stewart-Haas que disputa a NASCAR nos EUA.  Indago se Gene Haas, dono da equipe, tem realmente noção daquilo em que está se metendo.

Não é difícil de enxergar os motivos que me levam a crer que o esporte que eu sou fã está em perigo.  O modelo adotado pela categoria resultou em aumentar os custos, atrair parceiros cujos envolvimentos com o esporte era frágil, dificultar a situação daqueles realmente envolvidos, não procurar atrair novos consumidores e não conseguir melhorar o produto oferecido.  Por certa ótica, a questão não é a possibilidade da Fórmula 1 acabar e sim se ela realmente merece continuar existindo.  Qualquer empresa que em seu auge de sucesso comece a tomar um modelo empresarial equivocado e muito arriscado está sujeita ao fracasso, esta é uma das regras do capitalismo mais básicas.

Se acabar, o CVC irá investir em outro negócio com parceiros que não estão atentos ao que foi feito na Fórmula 1, a Mercedes continuará produzindo seus carros de luxo, a Ferrari e a McLaren continuarão vendendo seus carros esportivos de luxo, a Red Bull estará focada em vender bebida energética e boa parte do resto fechará as portas.  A cidade de Hinwil na Suíça é sede da Sauber que emprega boa parte dos 10 mil habitantes dela sofrerá um bocado, como outros envolvidos na Fórmula 1.  Os fãs que sobraram da categoria ficarão órfãos sim, mas se ocuparão de outra maneira nos domingos.  É a tal destruição criativa do economista austríaco Joseph Schumpeter.  Eu espero estar sendo pessimista e continuar assistindo as corridas no fim de semana.  Que a FIFA e o COI estejam alertas para que seus eventos no futuro continuem sólidos.

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