Os 2.170 km que separam as cidades de Colônia
na Alemanha e Edirne na Turquia podem ser percorridos em cerca de 21 horas
passando por outros 6 países. Ambas
cidades foram fundadas pelos romanos na antiguidade, mas outra coincidência pode
ser traçada entre as duas por incidentes envolvendo imigrantes. Colônia recentemente foi marcada, na última Véspera
de Ano Novo, pela onda de ataques sexuais a cerca de 100 mulheres locais por
grupos formados por refugiados da Síria e imigrantes ilegais, pelo menos os que
foram identificados pela polícia local pertenciam a estas categorias. Este foi um episódio marcante que chocou a Europa
e também a opinião global e que tem várias similaridades com a histórica
Batalha de Adrianópolis travada no ano de 378 DC.
No século IV, os bárbaros começaram a ser cada
vez mais incômodos ao Império Romano, que já havia se dividido em dois. Os constantes embates com os romanos na
fronteira dos dois impérios erodiriam a integridade da nação mais poderosa da
Idade Antiga. Entretanto, os bárbaros
passavam longe de ser uma comunidade unida e amistosa entre si. Os temidos Hunos avançavam da Ásia para o
Leste Europeu obrigando os povos desta região a se deslocar para outras áreas,
entre eles os Godos que começaram a emigrar para dentro do território romano,
em específico ao sul do Rio Danúbio nos Balcãs.
A motivação dos godos era em parte semelhante à dos sírios fugindo do
terror praticado pelo Estado Islâmico em suas terras.
Inicialmente, o movimento migratório iniciado
em 376 era satisfatório para ambas as partes, os godos poderiam obter refúgio
dos hunos em território romano e os romanos compensariam o seu encolhimento
demográfico usando os godos para se tornarem soldados, fazendeiros e
trabalhadores necessários para reerguer a decadente economia do império. Mas o tratamento injusto dispensado pelas
autoridades romanas locais aos godos rapidamente colocou os dois povos em pé de
guerra. Os romanos subestimaram a
quantidade de refugiados godos que atravessaram o Danúbio e não tinham comida
suficiente para alimentá-los. Para
piorar, os governadores locais começaram a cobrar preços exorbitantes pelos
alimentos, forçando os godos a até venderem suas crianças como escravos. Enquanto os romanos deslocavam suas tropas
para confrontos com os iranianos, um novo inimigo surgia no coração do império,
que menosprezou a capacidade de organização dos imigrantes e também a
capacidade militar destes.
Temendo pela agressividade dos godos, que se
rebelaram e começaram a saquear cidades romanas, o imperador romano oriental
Valente chamou de volta suas tropas no Oriente Médio e pediu ajuda à sua
contraparte ocidental, seu sobrinho Graciano, que enviou reforços para lidar
com as crescentes hostilidades. Graciano
havia obtido vitórias contra tropas bárbaras no oeste europeu o que causou
inveja em Valente. Em 6 de agosto de
378, ainda sem os reforços ocidentais, Valente foi informado de uma tropa de
godos se aproximando da cidade de Adrianópolis, atual Edirne. Movido pela tentação de obter uma vitória
contra os godos sem o auxílio de Graciano, Valente resolveu atacar os godos,
que eram comandados por Fritigern, um líder godo que os romanos já tentaram
assassinar anteriormente. O que Valente
não contava era que a informação do número de godos era incorreta, na verdade
as tropas de Fritigern eram mais numerosas que o informado. O líder godo ainda tentou um acordo com os
romanos, mas Valente apesar de conselhos para esperar os reforços rejeitou o
acordo e marchou para o combate. Após
várias horas de caminhada, as tropas romanas chegaram aos arredores de
Adrianópolis exauridas debaixo de um sol castigador e contra uma tropa mais
numerosa e muito mais bem equipada que se imaginava, e bem descansada. O massacre era um resultado mais do que previsível
diante de tanta prepotência e falta de preparo por parte dos romanos. O imperador Valente foi morto, as tropas
foram dizimadas, sem contar que os godos incapacitaram a produção de armas
pelos romanos por um bom tempo naquela região.
Os godos com tropas reforçadas
até mesmo com hunos continuaram atacando cidades do império apesar de não
conseguirem vitórias contra as principais fortificações romanas. Um acordo entre os povos beligerantes foi
obtido posteriormente em 382, no qual os godos obtiveram vantagens importantes
como novos “cidadãos” romanos. Em 410,
os visigodos saquearam Roma, em mais um passo para o declínio do império, um
resultado do fracasso completo da estratégia de incorporar uma população
estrangeira à nação romana.
Movimentos migratórios sempre existiram e
continuarão existindo, nações foram formadas graças a estes, a cultura de um
país pode se beneficiar em muito, isso sem contar que muitas vezes imigrantes
contribuem significativamente para a força de trabalho do país. O Brasil se beneficiou e muito dos movimentos
migratórios ao longo dos séculos. Hoje,
o país possui uma cultura diversificada e rica graças a estes imigrantes. A imigração é benéfica quando ela adiciona à
nação, quando as gerações de imigrantes são assimiladas dentro da população
local. Mas se a imigração cria “uma
nação dentro de uma nação”, os problemas surgirão como a história do Império
Romano nos ensina.
Muito se mudou, para melhor, entre 376 até os
dias atuais. Hoje seria impensável,
ainda bem, imigrantes vendendo crianças como escravas, mas a falta de preparo
das autoridades da nação que recebe os imigrantes não mudou muito para o
espanto geral. Como os godos, os
refugiados sírios chegaram à Europa em número maior que se previa e sem um
planejamento adequado para estes serem absorvidos pelo mercado de trabalho
local. Em grandes números, os imigrantes
tendem a se isolar da população local.
Xenofobia e discriminação não resolvem e até agravam, em algumas vezes,
o problema. Aliás, genocídios são
iniciados a partir de preconceito como a história nos ensina. Mas achar que os problemas de discriminação serão
resolvidos só com boas intenções é ignorar as possíveis consequências de uma
imigração maciça e desordeira.
Os romanos queriam soldados, enquanto a
comunidade europeia procura profissionais com um certo grau de
qualificação. Muito se fala que os
refugiados sírios possuem alto grau de instrução e podem trabalhar em empregos
para o qual o encolhimento demográfico da Europa subtraiu profissionais. Não duvido que hajam sírios bem formados e
competentes, agora achar que a maioria da população tem essa capacidade é exageradamente
otimista ao meu ver, ainda mais para um país com uma posição tão medíocre no
índice de educação da ONU. O resultado é
que um mercado de trabalho exigente como o europeu não tem vagas para tantos
refugiados, que vão acabar se ocupando de tarefas menos qualificadas que os
europeus não gostam de realizar, isso se estas estiverem disponíveis. A barreira da língua é outra que atrapalha e
isola os imigrantes, dificultando a integração destes com a população local. Mas a barreira cultural é o maior problema, ainda
mais vindo de uma região onde os direitos das mulheres e a liberdade religiosa
são pouco respeitados. Qualquer
concessão nesses pontos por parte dos europeus devido a “diferenças culturais”
é inaceitável. Os padrões de sufrágio,
liberdade e direitos existentes nas nações desenvolvidas são aqueles que os
imigrantes devem se adequar e não vice-versa.
O império da lei não pode ser alterado.
Os ataques às mulheres em Colônia mostram que
há um conflito étnico existente em progresso e uma evidente subestimação do
problema pelos europeus. Como Valente em
378, a polícia local de Colônia não quis reforços e perdeu o controle da situação. A postura “paz e amor” dos governos europeus
não é eficaz e atiçará ainda mais a extrema direita, que é por definição
xenófoba. Não há solução fácil e nem
evidente para este problema, sendo que este ainda pode se agravar. E os ataques terroristas em Paris mostram que
os bárbaros já cruzaram o Danúbio há muito tempo.
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