sábado, 5 de setembro de 2015

A Conquista dos Planetas dos Herbívoros

O recente acidente com o caminhão transportando 110 porcos em Carapicuíba causou uma comoção, até um certo ponto grande, em virtude do sofrimento dos animais presos debaixo das ferragens.  O “final feliz” para os porcos resgatados é até emocionante.  O sofrimento alheio, mesmo de animais, é algo que deve ser evitado e combatido, embora nesse caso não houve dolo e sim um acidente.  Apesar dos porcos terem como destino o matadouro, estes devem ser respeitados até o fim.  Algumas religiões até exigem rituais específicos para abates de animais, mostrando o devido respeito a estes animais, por sinal merecido.  Não existe justificativa para tortura e sadismo, mesmo que o animal venha a se tornar salame ou rosbife e, portanto, em touradas sempre torço pelo touro.

Antes essas exibições de crueldade eram aplaudidas quase que unanimemente, mas à medida que a (parte da) raça humana evoluiu, rodeios, farras e espancamentos de animais em gerais estão sendo condenados publicamente, e mesmo assim ainda existem os fãs destas barbáries.  O direito dos animais ganhou uma atenção maior recentemente, mas fica a dúvida de até onde eles têm direitos.  Bovinos e suínos são mamíferos artiodáctilos que possuem uma inteligência limitada, mas considerável e sentem dor e tristeza.  Seria justo condená-los a uma vida de cárcere cujo encarcerador decide quando estes serão executados?  Dizem que porcos são ótimos animais de estimação, o que torna quase impossível algum dono de porco de estimação comer presunto.  Quem assistiu Babe e City Slickers talvez tenha virado vegetariano.  Quem gosta do The Smiths, provavelmente concorda que Meat is Murder.  Duvido que algum dono de cachorro vá à Ásia e procure comer carne de cachorro em restaurantes.

Quem estudou ecologia, a ciência e não o modismo, sabe que porcos e vacas ocupam o segundo nível na pirâmide trófica, acima apenas dos seres autótrofos, os vegetais.  O ser humano no seu despertar não estava no topo desta pirâmide, mas escalamos até o topo basicamente eliminando os nossos predadores.  Estou para conhecer alguém que queira, em sã consciência e livre de hipocrisia, ter um nível trófico acima do nosso atual.  Se todos nós nos tornássemos vegetarianos, então o ser humano deixaria de ser o predador dos porcos e das vacas, e estes por sua vez se tornariam nossos competidores.  Para se minimizar o sofrimento animal, a pirâmide trófica teria dois níveis só.  Faço a pergunta, existiria alimento suficiente para 8 bilhões de pessoas, 2 bilhões de vacas e 1 bilhão de porcos (populações estimadas)?  Isso sem contar os outros herbívoros existentes. Vale lembrar que planejamento familiar não é exatamente um forte do reino animal e, portanto, alguns animais sem um controle por predadores tendem a se tornarem pragas.  Os quase inúmeros roedores e insetos ao longo da história sempre competiram por alimentos conosco, e muitas vezes nos derrotaram.

Sem predadores, os herbívoros podem até se expandir além da capacidade de geração de alimentos pelo ecossistema, para esse caso Thomas Malthus estaria certo, o que causaria uma inevitável escassez de alimentos, possível extinção de vegetais e futura fome disseminada entre os herbívoros.  Se nos tornássemos todos vegetarianos, a motivação de prover alimentos para nossos novos competidores desapareceria e, pior, apareceria bastante motivação de lutarmos com eles pela quantidade limitada dos alimentos disponíveis.  Aliás, de acordo com a ecologia, duas espécies não ocupam o mesmo nicho ecológico.

E a pergunta que não quer calar, mesmo que a raça humana se torne herbívora, o que fazer com os seres carnívoros?  Nos aliamos a dois seres, cães e gatos, por estes possuírem hábitos carnívoros.  Aliás, os nossos amigos felinos são exclusivamente carnívoros.  E ainda não ouvi falar de cachorro vegano.  Imagino que depois do homem, os maiores predadores de vacas e porcos são os cães e os gatos, ou algum defensor dos animais tem outra explicação para a origem das rações para cães e gatos?  Na Idade Antiga, para se controlar a população de roedores que dizimavam colheitas estocadas em celeiros, os gatos foram introduzidos à sociedade para manter sob controle esse tipo de praga.  Pode se dizer que a humanidade prosperou graças a eles e suas sanhas assassinas.

A evolução das espécies aqui neste planeta começou com seres autótrofos e depois surgiram os heterótrofos, como nós.  Por definição, a sobrevivência dos heterótrofos depende da alimentação de outros seres.  Vai demorar um pouco para alguém descobrir como os seres humanos, e cães e gatos, possam fazer fotossíntese.

Crueldade é algo indesculpável, definitivamente não é kosher.  Os ativistas devem continuar sua luta por um tratamento justo aos animais, inclusive àqueles que servirão de alimentos.  Mas até alguém me responder o que fazer para me tornar um ser autótrofo e como ensinar às vacas e aos porcos que todos temos direito aos alimentos, eu vou assumir publicamente minha posição na pirâmide trófica.  Respeito a opção alheia, mas continuarei apreciando churrasco.  Mesmo que um dia, H.G. Wells venha a ter razão e meus descendentes se tornem elóis, ou seja alimentos dos morlocks, conforme retratado na obra A Máquina do Tempo.

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